Muitas pessoas me perguntam sobre o processo criativo, especialmente sobre os princípios de distribuição espacial e composição. Costumo dizer que, antes de entrarmos na construção visual da interface propriamente dita, não custa lembrar que precisamos construir a identidade conceitual e editorial da nossa proposta. Afinal, de que nos adiantará o domínio da gramática se o que temos para comunicar não está bem definido? Nossa mensagem precisa estar coesa; sua personalidade, sem idiossincrasias que nos desviem de seus objetivos. A pregnância começa na proposta conceitual.
Relação da Teoria da Gestalt e as duas abordagens: é preciso ter em mente que o estudo da Gestalt tem um caráter neutro quanto à aplicação de seus enunciados. Assim, conhecer a teoria somente trará resultados práticos e desejados se houver direcionamento. É preciso, tendo em vista tanto a abordagem do design quanto a artística, saber em que aspectos a interface deve ser orientada e equilibrada entre esses dois enfoques. Por exemplo: se a interface a ser construída será projetada para uma utilização constante, percebemos a sua proximidade conceitual a uma ferramenta, um objeto utilitário, ou seja, com uma personalidade prioritariamente ligada ao design. Por outro lado, numa interface que considere a experiência única ou temporária do usuário, ou que esteja preparada para um comportamento imprevisível do mesmo, estaremos, muito provavelmente, bastante próximos da abordagem artística.
A abordagem do design pensa o uso da interface numa perspectiva universal, humanizada, positiva, visando facilitar a experiência, eliminando o máximo de ruídos que, considerando-se o uso repetido da interface, tiram sua eficiência, aumentando o trajeto entre objetivo e resultado funcional.
Já abordagem artística foca muito menos no sentido utilitário, priorizando a experiência numa perspectiva plural, que se estende da empatia ao caos. Considera-se tanto a facilidade do uso quanto o antiuso. Tem-se aqui um fator experimentalista que busca tanto a utilização contínua quanto a experiência única – e até mesmo a não-experiência (ou antiexperiência).
Pelas subabordagens/abordagens derivadas, combinando as duas macroabordagens (design e arte) com outros enfoques direcionadores, obtemos o coeficiente de originalidade que dá personalidade a cada interface. É justamente a combinação das abordagens, orientadas por objetivos bem definidos, que determinarão o sucesso ou o fracasso de uma proposta de comunicação visual.
Algumas das abordagens derivadas mais utilizadas são: a publicitária, a comercial, a lúdica/de entretenimento, a comunicacional e a utilitária. A ideia de construção conceitual das interfaces, representando o relacionamento entre as abordagens e as subabordagens, fica bem clara nesta imagem. Note a riqueza de combinações possíveis na construção do desenho conceitual da interface.
Temos, enfim, a construção visual da interface, agora, mesmo sem existir visualmente, já com vida própria, personalidade e objetivos bem definidos. Ela se situando com clareza entre as diversas abordagens, possuindo seu coeficiente de originalidade.
Estamos aptos a buscar na teoria da Gestalt e na Semiótica os princípios mais adequados aos seus objetivos, direcionando tanto os aspectos latentes, abstratos e inerentes à percepção visual, pela “gramática subliminar” da Gestalt, quanto os aspectos analíticos, relacionais e mnemônicos da semiótica. Em suma, se temos a gramática, agora temos a capacidade de construir as estruturas, as “frases visuais” mais adequadas, melhorando a experiência do usuário, aprimorando o relacionamento deste com a interface, que deverá, assim, possuir máxima coerência com seu desenho conceitual.
Por mais que muitos estudiosos da comunicação visual se esforcem em estabelecer práticas ideais, baseados em testes comportamentais, criando “receitas” para uma eficiência máxima, a interface ideal como ideia universal é uma utopia, pois desconsidera peculiaridades estéticas e conceituais inerentes a cada proposta. O que existe – e precisa ser o foco da pesquisa estética – é o total reconhecimento da personalidade única de cada projeto e a consequente composição de um layout que possua o máximo de coerência com seus princípios e objetivos. O conhecimento da Teoria da Gestalt será fundamental para se compor tal layout, feito sob medida para cada caso.