Começamos, há alguns dias, uma série sobre o que podemos esperar do mundo dos negócios mobile em 2016. Se você não acompanhou, aqui está a parte 01 e aqui a parte 02. Hoje, terminamos a série falando sobre notícias, varejo, carros e educação. Vamos lá?
As notícias
No ano que vem veremos bastante movimentação no mercado de notícias online, mas antes vale a pena discutirmos o que eu estou considerando aqui como o “mercado de notícias online”. Essencialmente quando falamos da forma como consumimos novas informações, sejam elas específicas a um evento que tenha ocorrido ou uma análise mais profunda dos impactos e reverberações dele ou ainda apenas conteúdo que seja do nosso interesse, estamos falando de uma indústria bilionária.
O modelo de negócio dos principais players nesse mercado no Brasil e no mundo ainda é fortemente baseado na venda de anúncios, mas 2016 vai ser um ano em que novas formas de consumir notícias serão endereçadas.
Começamos com o Facebook Instant Articles, que é uma nova forma de produtores de conteúdo construírem e publicarem seus artigos e notícias. As principais características são a melhora (considerável) na velocidade com as quais os artigos serão carregados (e isso remete à discussão sobre o tempo que um site demora para abrir por conta dos anúncios) e a característica responsiva dos anúncios (obviamente que os artigos são consumidos dentro do Facebook e dentro do seu próprio feed). Se levarmos em conta que o Facebook é uma empresa que vive atualmente da venda de anúncios e que a sua principal fonte de renda é advinda de anúncios mobile, o ciclo e a intenção de negócio fica explícita.
Outro player que também está se movimentando nesse mercado é o Twitter, lançando o recente Twitter Moments. A ideia é alavancar o posicionamento do Twitter como fonte de notícias com um caráter social e muitas vezes acontecendo antes do fato ser oficialmente publicado pelas mídias mais tradicionais. Com a volta do Jack Dorsey como CEO, fica claro que o Twitter vai tentar se posicionar nesse mercado, essencialmente pago por anunciantes. Vale lembrar que a própria Apple está de olho nessa área. Enfim, veremos muita luta em cima desse assunto em 2016.
No Brasil, players como a Globo.com, UOL, R7 e players do Vale do Silício estão dividindo o total de 66 bilhões de impressões de anúncios digitais mensais. Com esse número, o Brasil fica atrás apenas dos Estados Unidos.
Todo esse dinheiro é dividido por alguns players ou plataformas, às quais sistematicamente nos dirigimos no mundo digital para o consumo de informações que sejam relevantes para nós.
É importante notarmos também que a porcentagem de anúncios direcionados para resultados de buscas e classificados está sendo confrontada com anúncios veiculados e direcionados para display e social, o que essencialmente rivaliza (em partes) com a hegemonia do Google e transfere esse poder para redes sociais e campanhas de display em plataformas de notícias.
É importante mencionar o impacto que um evento grande, como as Olimpíadas no Rio de Janeiro, por exemplo, tem no mercado de mídia e no investimento nele. É provável que em 2016 muitos players brasileiros sejam beneficiados por esse evento.
Um último player que deve ser mencionado, tanto pelo tamanho que está alcançando como pelo que representa, é o Medium. O Medium tenta endereçar a problemática de consumo de conteúdo no mundo digital muito calcado em boas práticas de experiência do usuário, como muito cuidado na tipografia, hints para o tempo de uma leitura e outras funcionalidades. É provável que veremos em 2016 uma transição na qual não fará mais sentido blogs individuais, apenas posicionamentos dentro de plataformas que endereçam de forma consistente o consumo de conteúdo online. O mesmo pode acontecer com outros tipos de conteúdos, como livros, por exemplo.
Sobre video on-demand e outras disrupções nesse sentido
Um dado relevante apresentado acima é a quantidade de dinheiro que está sendo gasto em anúncios na forma de vídeos. Em 2016 veremos cada vez mais o campo de VOD e outros bichos disruptivos nesse segmento.
Começando pela solidificação de iniciativas multicanais e complementares, como os aplicativos Globosat Play (Telecine Play, Globonews Play, Off Play). Impulsionados pela melhora na infraestrutura da rede de dados, agora é efetivamente possível que os principais canais veiculem os seus conteúdos usando plataformas de video on-demand ou live streaming. O interessante é o conceito de parcerias que está sendo forjado, no qual o assinante de uma operadora de TV a cabo pode acessar o conteúdo no seu celular de forma complementar.
Outro ponto é o potencial da junção do mundo dos canais televisivos e o mundo mobile, que está em produtos complementares à grade dos mesmos. Se o canal vê muita audiência direcionada a programas de culinária no GNT, nada mais plausível do que fornecer aplicativos como o Receitas GNT, assim como SporTV Gols, Cartola FC, entre outros. A ideia aqui e que vai ser explorada em 2016 é como ocupar e manter o mindshare do consumidor em um mundo que compete acirradamente pela sua atenção. Aplicativos task-oriented relacionados com conteúdos televisivos serão, cada vez mais, tendência em 2016; no entanto, depende dos produtos de conteúdo e gatekeepers desse segmento se posicionarem e exercitarem novas formas de interagir com seus conteúdos, sempre privilegiando múltiplos canais.
Esse mercado é observado por perto por players como o Youtube da Google, o Netflix com seus 70 milhões de assinantes no mundo todo ou ainda pela disrupção em uma camada mais estrutural, como o novo Apple TV. O modelo de negócio ainda está oscilando entre assinatura e veiculação de anúncios, mas é cada vez mais provável que ocorra uma decomposição da grade conforme a experiência do usuário ao assistir televisão e vídeos seja melhorada.
No Brasil, um mercado que está relativamente mal atendido é o mercado de esportes ao vivo (especificamente futebol). Uma vez resolvida a veiculação desses conteúdos, veremos um mercado bem competitivo e em cima de um conteúdo que sempre teve público no Brasil.
Com as eleições presidenciais em 2016 nos Estados Unidos, players mais efêmeros e com caráter ao vivo e social começarão a ser explorados, como o Periscope ou o Meerkat. Dependentes de uma boa infraestrutura, players como esses podem impactar a forma como interagimos com eventos cuja cobertura oficial pode demorar ou não ser possível.
O presente do varejo é online e o presente do online é móvel
Chegamos ao final de 2015 vendo o mobile commerce como uma iniciativa essencial e indispensável para o sucesso do seu varejo no mundo online.
Se você é um grande varejista e ainda não possui um canal para endereçar o varejo mobile, você está fora da competição em 2016. Players como Netshoes, Dafiti, Walmart, Magazine Luiza, Kanui, Americanas.com, Centauro e outros estão bem posicionados, e se você ainda não está se movimentando, pode ser tarde.
O diferencial competitivo passa pela formação de uma unidade de produtos digitais interna, pela formalização de um time capaz de endereçar as demandas do mundo mobile e web e pela capacidade de enxergar boas oportunidades de negócio relacionadas ao seu contexto.
O mercado de buscadores está quente e continuará quente (ainda mais quando chegamos perto da Black Friday), com players que “viraram mobile” há bastante tempo e são drivers para essa adoção, como o Buscapé. Na Black Friday especificamente veremos cada vez mais a consolidação de iniciativas muitas vezes bem ousadas e que geram frutos diretos para quem se arrisca.
Um mercado que pode ficar aquecido em 2016 é o de social commerce (mas não no sentido antigo da palavra, necessariamente acontecendo por dentro de redes sociais), com a chegada de players como o YOP, Bedo.la e outros modelos de negócios interessantes que sejam relacionados. Entretanto, enquanto a forma de aquisição e obtenção de receita não estiver bem endereçada, essas iniciativas podem ser frustradas.
Em 2015 nós falamos sobre o uso de beacons para fazer a integração entre online e offline e garantir que a oferta certa chegue ao usuário certo no local certo, mas parece que são poucos (bem poucos) os que conseguiram executar devidamente uma iniciativa de beacon que seja consistente. Existem outras iniciativas que cruzam dados de localização de wi-fi, GPS, e IPs disponibilizados por operadoras e antenas para determinar a localização e fazer o geo-fence do usuário para sugerir promoções.
No segmento de crowdfunding, é esperado que parte do capital de investimento vindo de venture capitalists (VC’s) seja complementado por frentes de crowdfunding, nesse sentido startups brasileiras como a Kickante serão beneficiadas.
No mundo, as principais inovações em varejo online acontecerão na Ásia e serão puxadas por players como a indiana Flipkart ou a Chinesa Alibaba. Por lá, o e-commerce deve crescer 30% no próximo ano, e metade dessas compras acontecerão no mobile. Temos que ficar de olho em empresas como a Tencent e a Baidu.
A batalha campal na China vai ser animada também pela entrada da Apple e o Apple Pay. Um concorrente direto da gigante nesse mercado é o Alipay, que já conta com 400 milhões de usuários registrados. Essa oportunidade ainda será alavancada pela adoção de outras grandes empresas, como toda a rede da Marriot no país, por exemplo, que pretendeaceitar pagamentos com Alipay até o final de 2016.
Carros, táxis, Uber e a essência da mobilidade pessoal e urbana
Estamos sempre de olho nas tendências de novas plataformas e interações, principalmente sobre carros. Vemos que em 2016 esse mercado vai ficar aquecido, mas a análise não pode ser feita superficialmente; deve considerar toda a complexidade que o mercado automobilístico impõe.
Então, vamos começar pelo tamanho do mercado automobilístico quando comparado com outras fontes:
Esse gráfico indica que se existe um mercado no qual vale a pena uma disrupção e um processo gradativo de unbundling, seria o de carros. Olhando toda a stack relacionada com eles, chegamos a um modelo (minimamente simplificado) que é composto das seguintes camadas:
Analisando dessa forma, vemos que diversos players podem se posicionar para obter valor nessa cadeia.
Vamos começar pela camada de hardware. Um jeito de olharmos para o mercado de carro (ou transformar metal em veículos) seria segmentar por tipo de expectativa em relação a carros:
- Utilitarismo: o carro é apenas uma conveniência para você se transportar do ponto A ao B;
- Design e estilo guia a sua compra: o carro é uma extensão de quem você é socialmente;
- Performance: o carro é uma experiência prazerosa.
Nesse sentido, players como Fiat, Ford, Volkswagen, Renault, Peugeot, BMW, Volvo, Audi e todos os outros conhecidos estão (cada um em seu segmento) bem posicionados. A partir daí, passa a ser importante avaliarmos como o mundo mobile influencia inclusive no momento da compra desses carros. No entanto, é provável que o mesmo movimento que ocorre com as telecoms aconteça nesse mercado, ou seja, transformar metal em veículo já não vai ser a maior geração de valor, serão iniciativas em cima disso. Players entrantes como Tesla e Google estão ativamente atacando esse problema do ponto de vista de hardware mais especializado e moderno (carros elétricos, por exemplo) e do ponto de vista de software e inteligência artificial (carros autônomos, por exemplo). Veremos em 2016 posicionamentos claros dessas empresas para entrarem nesse negócio e não só delas mas também da Apple.
Na camada de carros autônomos e navegação o problema vai ser uma combinação de quem possuir mapas bem detalhados e atualizados das cidades (Google Maps, Waze, Apple Maps, Here) e quem conseguir atacar a questão da inteligência para saber identificar objetos e lidar com todos os aspectos de segurança. Nesse sentido, é bem provável que a Google seja a mais bem posicionada, embora a Tesla tenha surpreendido nesse cenário.
Na camada de controle de frota, os aplicativos de táxi e outros estão muito bem alinhados para atender às demandas e lidar com a questão de distribuição e demanda em grandes centros urbanos. Eles já possuem uma base de usuários e de motoristas e uma forma sistemática de “abrir cidades” e lidar com o hacking de crescimento nesses centros urbanos, o que acirra a competição.
Na camada de plataforma de transporte, a tendência é a junção de cidades inteligentes e outras formas de transporte, como por exemplo os modelos da Zipcar ou a Zazcar, no Brasil. Assim como a junção de diversos tipos de transporte e uma melhor visualização e utilização dos serviços públicos. Essas camadas permitem também a junção com aplicativos mobile. Se você está em um carro, você escuta música? Quem domina música no mundo mobile? Youtube, Spotify, Pandora. Se você está em um carro indo para o trabalho e não precisa dirigir, por que não ir estudando inglês ou fazendo a unha ou o cabelo para as mulheres?
Em 2016 veremos a estabilização das plataformas, os primeiros passos formais dos principais players, as primeiras questões relacionadas à legislação e seguro contra acidentes, e o aumento da capacidade de adoção e aceitação de novas tecnologias nas sociedades mais conectadas.
Embora 2016 não seja o ano em que os carros inteligentes e autodirigíveis aparecerão no mercado, com certeza será o ano em que os players do Vale do Silício apresentarão as primeiras implementações ponderadas do ponto de vista de produto, mercado e experiência do usuário. Pense como se estivéssemos em 2007, quando o Steve Jobs anunciou o smartphone: quase toda a tecnologia necessária para construi-lo já estava pronta desde o início da década, mas ninguém havia consolidado em uma oferta consistente para os usuários. É isso que vamos ver ao longo de 2016.
Vale a pena ressaltar um movimento bem sucinto feito pelo Google em 2015 e que vai reverberar para os próximos anos: a gigante lançou como projeto open-source o TensorFlow. É importante entender que esse movimento pode estar relacionado ao movimento da compra do Android em meados de 2006. A Google entende que machine learning e outras formas de inteligência computacional serão o futuro de diversos serviços que usaremos nas próximas décadas, e está se posicionando para garantir o seu lugar no futuro.
Sobre o mercado de táxi e empresas como Uber, Lyft e outras, veremos em 2016 a continuação do movimento para capilarizar os serviços, seja por meio da 99Top, da 99 Taxis ou do EasyTaxi corporativo. Seja como for, a batalha legal para liberar ou não serviços relacionados nas cidades brasileiras e em outros lugares do mundo não será fator determinante para impedir que outros (ou os mesmos) serviços preencham essa lacuna na experiênca do usuário, que quer se locomover de forma mais inteligente em centros urbanos.
A educação vai mudar, cada vez mais
Em 2016 veremos a cristalização de diversas iniciativas para repensar o mercado e a forma como aprendemos e ensinamos algo para alguém. O segmento de educação está passando pelo mesmo processo de unbundling que ocorre em diversos outros setores. As mudanças ocorrerão em diversos contextos, desde uma educação mais social, consumida de forma adaptativa e customizada para o seu aprendizado, passando pela forma como você executa os seus experimentos em laboratórios, e chegando a gamification, que com certeza estará no centro desse processo. O impacto disso em mobile será percebido devido à escala e alcance do mundo dos smartphones e à alavancagem de consumo de conteúdo on-demand e on-the-go.
No Brasil, grandes grupos e universidades terão que entrar de cabeça em suas estratégias digitais, pois players como Descomplica, Passei Direto, Duolingo e outros estão se posicionando bem. É importante percebermos que não se trata apenas da forma como aprendemos, mas o unbundling vai passar desde o processo de seleção e compra dos tipos de lanches das crianças até a forma como recebemos notas, tiramos dúvidas ou até vamos à escola.
Agradecimentos
A escrita desse artigo não seria possível sem a colaboração de diversas pessoas importantes e relacionadas direta ou indiretamente com muitos mercados cujas tendências são mencionadas aqui. Entre elas e especialmente agradeço: Carolina Almeida, Thiago Catão, Rogério Martins, Geraldo Faria, Victor Oliveira e o restante do time da Concrete Solutions e clientes.
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Obrigado pela visita e até a próxima!