Na manhã do dia 29 de setembro, há uma semana, uma
das primeiras notícias que recebi dando a já habitual checada no meu
stream no Twitter foi a de que 91% do Buscapé
haviam sido vendidos por U$ 342mi para o grupo Naspers, da África do Sul.
Desconsiderando as transações feitas durante a loucura da bolha
pontocom de 2000 e as vendas de portais/fusões, esta foi, de longe, a
maior transação de uma empresa nacional exclusivamente de internet.
Num primeiro momento vi várias reações
no Twitter em relação ao preço do negócio, com conhecidos
empreendedores web tupiniquins achando o valor alto demais, e alguns
desconhecidos ventilando besteiras do tipo “é a bolha 2.0 no Brasil!”.
Como o Buscapé é uma empresa de capital fechado, ninguém tem detalhes
de quanto a empresa fatura, quanto disso é lucro, e quais suas projeções
para o futuro, então não dá pra analisar se o preço é justo ou não.
Mas levando em consideração que o
Buscapé tem o melhor modelo de negócio já descoberto na internet e está
intimamente ligado a um setor (o e-commerce) que vem crescendo 40% ao
ano constantemente, eu chuto com convicção que as chances de os
compradores recuperarem o investimento no longo prazo é mais alta do
que a média em aquisições assim.
Isso porque, apesar de o Buscapé já ser
um “gigante” na web nacional, o potencial de crescimento deste mercado
ainda é muito grande. Se tomarmos como parâmetro uma transação recente
no mercado americano, o maior do mundo, é fácil perceber o tamanho da
montanha que pode ser escalada: a compra da Zappos pela Amazon por US$
928mi.
Conhecida pelo atendimento de sonhos ao
consumidor, a Zappos é, no final das contas, apenas uma loja de
vestuários que tem menos tráfego que o Buscapé e, apesar de faturar bem
mais (cerca de US$ 1bi por ano), tem margem de lucro pós-impostos entre
3% a 4%, enquanto a margem da empresa brasileira é de, certamente, no
mínimo 10%, supondo que seja semelhante a de uma outra empresa que atua
no mesmo setor e mercado, a MercadoLibre Inc, dona do Mercado Livre.
Ou seja: mesmo com mais usuários,
melhor modelo de negócios, maior margem de lucro e maior potencial de
crescimento, a empresa brasileira foi vendida por três vezes menos que a
americana pelo simples fato de o mercado de lá estar anos à frente do
nosso e de que um usuário americano traz mais receita que um usuário
brasileiro. A princípio, esse fato pode ser mais um motivo pra
lamentarmos nossa origem, mas pode-se também encará-lo como um
indicativo do que podemos alcançar se percorremos esse longo caminho.
Porém, não é o preço do negócio que
deveria interessar pra mim ou pra você lendo esse artigo (a menos que
seja um sócio do Buscapé). O que deveria saltar aos olhos de todos os
empreendedores e investidores é o que essa transação significa para o
mercado web nacional. Eu entendo que significa muito e acho que quem a
melhor definiu foi o Simon Olson, que chamou este de “o Skype moment”
do mercado nacional, em alusão à venda do Skype para o Ebay em 2005 por
US$ 2.6bi, a primeira grande aquisição de uma startup européia depois
da bolha.
Grandes transações como esta do Buscapé (os “hits”, como chamou Simon) são um importante sinal para os investidores de risco (neste post ele explica), mas eu diria também que desempenham um importantíssimo papel em relação aos empreendedores.
Da mesma forma que ver o César Cielo
ser campeão olímpico e mundial vai servir como um exemplo e um estímulo
para milhares de crianças praticarem e fazerem crescer o esporte, um
empreendedor web que lê nos veículos de mídia
que uma empresa fundada por quatro brasileirinhos então recém-saídos da
universidade alcançou tamanho sucesso passa a acreditar que é possível
conseguir o mesmo. Assim, olhando em perspectiva, a venda do Buscapé
parece ser a faísca que faltava pra coisa toda pegar fogo.
De um lado, já dá pra notar de uns dois
anos pra cá um crescente (embora ainda tímido) interesse em investir em
startups de tecnologia no Brasil. O que antes a gente só via acontecer
lá fora e acompanhava via blogs como o TechCrunch, começou a acontecer
e aparecer aqui via Monashees Capital, DFJ-Fir Capital, Michael Nicklas e sua SocialSmart, da própria Naspers (que já havia comprado
parte da Abril, investiu em duas startups e cogitou investir na
power.com em 2007) e até mesmo através do Governo Federal, que via
Finep lançou neste ano o programa PRIME do qual muitas startups web
participaram.
Do outro, temos o surgimento de algumas
(e o amadurecimento de outras já existentes) pontocom no Brasil criando
serviços realmente inovadores, indo contra a maioria dos
empreendimentos que até então se resumiram a traduzir e adaptar o que
já existia no exterior. Mas mais do que isso, é nítido também o
crescente interesse pelo empreendedorismo tecnológico. Apesar de os
concursos públicos continuarem atraindo parcela grande dos melhores
cérebros do país (às vezes eu sinto que o Brasil só vai pra frente se
abolirem eles), a mudança de mentalidade da nova geração já foi captada
em diversas pesquisas e o jovem que deseja ser empreendedor já não é
mais visto como um ET nas famílias (bem, pelo menos na maioria delas).
Para os investidores, faltava a
perspectiva de haver uma saída para seus investimentos. Para os
empreendedores, faltava um exemplo daqueles que os fazem sonhar alto. O
que faltava, eu acho que agora não falta mais. Aliada ao cenário
econômica favorável (a marolinha veio e já foi), ao crescimento da mão
de obra qualificada e até mesmo ao aumento da auto-estima do
brasileiro, esta venda do Buscapé pode ajudar a fazer muito bem para o
mercado web nacional.
Ps.: O Startupi tem uma entrevista
com o Rogério Romero, fundador/CEO do Buscapé, sobre o negócio e a
história da empresa. O Rogério também fala um pouco da história da
empresa numa palestra que deu no 3o Desafio GV-Intel, no ano passado. Vídeo abaixo: