Foi no ano 2000, no início do que muitos julgam como sendo a “era da internet moderna”, que Bruno Rodrigues lançou seu primeiro livro sobre webwriting. Na época, redação para o meio online era uma novidade, assim como a própria plataforma. Em quase 15 anos, bastante coisa mudou – tanto que o livro ganhou dois novos volumes, em 2006 e um neste ano de 2014.
Bruno Rodrigues, que é consultor de informação e comunicação digital, além de instrutor de webwriting e arquitetura da informação, fala, nesta entrevista, sobre as mudanças que a área de conteúdo online sofreu nos últimos anos, sua integração com SEO e Arquitetura da Informação e como profissionais de texto e de desenvolvimento podem caminhar juntos e melhor.
Você foi um dos primeiros profissionais a falar sobre conteúdo para a internet no Brasil, no início dos anos 2000. E há anos cunhou a afirmação que “webwriter não é redator”. O que mudou nesta área em quase 15 anos?
Em especial, o entendimento de que ‘escrever para a internet’ vai além da redação propriamente dita. No meio digital, existe a convivência de vários tipos de informação: texto, foto, ilustração, ícone, áudio, vídeo, infográfico, tabela.
O verdadeiro ‘gestor da informação digital’ é aquele que, antes de tudo, entende o que é informação, independentemente do meio, e consegue trabalhá-la em um ambiente de convergência. Hoje, alguém que se vê como um mero redator para a mídia digital está morto profissionalmente.
A grosso modo, o que diferencia a redação para a web dos demais tipos de escrita e redação? Com uma leitura digital naturalmente fugaz e com o crescimento do mercado de e-books e e-readers, quais as mudanças e perspectivas para o webwriting?
Na mídia impressa, por exemplo, escreve-se para ser lido, o que significa que estilo e fluência são itens fundamentais. Na mídia digital escreve-se para que o conteúdo seja visto – ser lido é uma consequência, uma espécie de ‘prêmio’ para o conteúdo que consegue ser localizado.
Além disso, são raros os textos que os leitores leem até o fim, o mais comum é que o trecho final de um texto seja desprezado. Por isso, é preciso ser muito objetivo no que se escreve. Vale ressaltar que texto curto nunca foi sinônimo de objetividade, há diversos testes que demonstram que textos longos conseguem ser extremamente objetivos.
Quantos às perspectivas para o webwriting, hoje o mercado de produção de conteúdo deseja saber o que e como os leitores querem consumir a informação, e isso é inédito. Antes, os testes como usuários eram vistos como um mero detalhe; agora, por necessidade mercadológica, entender profundamente os anseios dos consumidores de conteúdo é essencial. Por isso, estamos em um momento especial, promissor, bem diferente de cinco, seis anos atrás.
Qual a relação de texto para web/webwiting, SEO e arquitetura da informação?
A gestão da informação digital é como uma ‘caixa de ferramentas’. Nela, o profissional precisa, ao longo de sua trajetória profissional, adicionar novos recursos para que consiga acompanhar as necessidades do mercado e dos usuários.
Por exemplo: deve-se levar em conta a usabilidade dos textos? Para isso criou-se o webwriting. É preciso estruturar bem a forma das informações serem acessadas? Há a arquitetura da informação. Como facilitar que os mecanismos de busca encontrem meus conteúdos? Utilize técnicas de SEO. Estas novas ferramentas nunca cessam de surgir, já que o usuário da mídia digital está cada vez mais exigente, e o universo de informações, cada vez maior.
Como esses profissionais podem trabalhar melhor em conjunto?
É um desperdício criar equipes interdisciplinares fixas para a produção de conteúdo. Apenas em momentos-chave eles precisam se encontram e, depois, rever o que foi feito, os resultados a cada etapa do trabalho. Para que o trabalho fique cada vez melhor, é preciso, também, que cada um dos lados tenha noções básicas das atividades do outro. Ou seja, tentar falar a mesma língua é uma grande vantagem.
Os drafts da W3C têm tido bastante foco na semântica. Temos tags específicas para data, local etc. Além disso, temos também microformats, com foco em definir certos termos para as máquinas. Como o webwriter lida com essa parte, que é mais técnica do que de conteúdo?
Cabe tanto aos webwriters quanto aos desenvolvedores terem noção de que, no momento em que informação e programação se juntam, é preciso ‘trocar figurinhas’ todo o tempo para que o resultado seja o esperado, em especial quando novas regras e parâmetros surgem. Como o código é base de um sistema de informação digital, eu sempre espero que o desenvolvedor aponte o que os redatores devem fazer, mas, ao mesmo tempo, se o webwriter não entender o universo do desenvolvimento, ele não saberá tirar dúvidas e nem mesmo questionar.
O que ainda é necessário mudar na comunicação com o leitor/usuário/cliente no meio online?
A questão cultural. Quem produz conteúdo ainda é formado por ‘escolas’ que focam no texto para ser ‘lido’, e apenas no texto. É como se ele fosse intocável, independentemente da mídia em que é publicado. Quanto ao leitor, ele sabe, cada vez mais, que deseja encontrar rapidamente sua informação, que ela vá direto ao ponto e que seja extremamente detalhada. Quem precisa mudar, portanto, é quem produz a informação.
É correto afirmar que estamos em uma época onde o conteúdo online está cada vez mais visual, mais dependente de imagens e vídeos do que texto?
Sim. Mas não podemos esquecer que imagem é informação. Quando fazemos esta comparação, é como se estivéssemos ficando mais ‘pobres’ na forma com que nos comunicamos. É um erro. O fato é que estamos consumindo outro formato de informação, apenas isso. Mas vale lembrar, também, que o uso da palavra – e não necessariamente do texto – vem aumentando cada vez mais por conta das redes sociais, vide nossos posts no Facebook e no Twitter.
Como a palavra se relaciona com a imagem em um ambiente onde a convergência de mídias é a regra?
Primeiramente, funcionando como um indexador para o Google. Um mecanismo de busca só consegue ‘ver’ uma imagem se existe uma palavra a ela associada. Depois, como uma expansão da informação que está sendo veiculada, ou até mesmo como uma forma de complementá-la.
Em termos de design e desenvolvimento, tem se falado muito de sites responsivos. Como isso se aplica à parte de conteúdo? Existe “conteúdo responsivo”?
De certa forma, sim. A palavra-chave do design responsivo é adaptação. Então, o webwriter precisa ter noção de que um componente em que uma informação é veiculada pode tomar o lugar de outro componente, justamente para que não se empobreça a experiência do usuário. O design responsivo adapta interfaces, mas não a ‘resume’. O conteúdo apresentado em um site pode ou não ser excessivo, e isso depende justamente da interface através da qual a estamos acessando.
Temos visto muita novidade na área de mobile – não só smartphones e tablets, mas também em objetos que até pouco tempo não eram conectados, como carros e eletrodomésticos. Como o conteúdo deve ser planejado hoje em dia, com uma variedade tão grande de possíveis dispositivos para leitura?
É preciso entender cada um destes meios, e criar diversos formatos para uma mesma informação. Cada um dos formatos deverá ser aquele que o usuário consumirá a informação da forma mais confortável possível. Pensar nisso chama-se Estratégia de Conteúdo, e nada mais é que mapear os caminhos e formatos que a informação irá tomar.
Marketing de conteúdo tem sido um dos grandes temas discutidos na área nos últimos anos. Webwriting e marketing de conteúdo podem ser considerados a mesma coisa, ou o segundo estaria contido no primeiro? Considerando que você já afirmou, em seus livros, em artigos e entrevistas, que “webwriting não é uma linguagem jornalística ou publicitária — é uma mistura das duas”, e marketing de conteúdo é uma forma de oferecer um produto ou serviço como objetivo final.
É simples entender a diferença: o webwriting se preocupa com a produção do conteúdo propriamente dita, enquanto o marketing de conteúdo avalia de que forma este conteúdo deve ser aprimorado para que seja possível ‘vendê-lo’ para o usuário de uma maneira mais persuasiva, objetiva, transparente – e o que precisa ser alterado no conteúdo para que ele possa ser encontrado mais facilmente.
Apesar de os seus três livros terem como título “webwriting”, os subtítulos deles trazem detalhes talvez sutis que mostram as diferenças: “Pensando o texto para mídia digital” (2000), “Redação & Informação para a web” (2006) e, por fim, “Redação para a mídia digital” (2014). Fale um pouco sobre o conteúdo de cada livro.
O primeiro focava no texto e em suas transformações do meio impresso para o digital, pois ainda estávamos nos primeiros anos da web comercial. O segundo ampliava o ‘leque’, apresentava outros formatos da informação além do texto, mas explicava de que forma eles se relacionavam com a palavra. O terceiro, recém-lançado, aborda as boas práticas acumuladas ao longo de mais de uma década, e ressalta a importância de irmos além, ou seja, conhecer e estudar novas ferramentas do universo da informação para a mídia digital. É um mercado fascinante, em que nada é estático.
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Artigo publicado na Revista iMasters, na seção “Entrevista”. Você pode assinar a Revista e receber as edições impressas em casa, saiba mais.
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