Há mais de uma década somos vítimas de uma
certa letargia frente a tela do computador.
Acreditamos nas promessas dos tecnocratas e visionários digitais
(como o hype viral do
MoveOn e similares) e, com isso, passamos a confiar demais em uma
forma de organização através da Internet.
Somamos voz aos bordões
do marketing, entulhamos sites com enfeites em Ajax e utilizamos apps
de todos os tipos para mídias sociais. Tudo isso com a fé de que o
cliktivismo poderia desencadear uma transformação social.
Mas o que
acontece é que nossa revolução fica cada vez mais a cargo das
tecnologias de San Francisco e das novas formas de publicidade. A
consequência é o encolhimento de nosso potencial revolucionário,
vítima da nossa crescente dependência dos artífices tecnológicos.
Clicktivismo é o ativismo poluído pela lógica
do consumismo. A publicidade e as ciências da computação subjugam,
dessa forma, o ativismo. Talvez o que melhor define esse tal de
clicktivismo é a obsessão por métricas. Cada link clicado e email
aberto é meticulosamente monitorado.
Para obter maior apelo das
massas, os clicktivistas diluem suas mensagens convocando
colaboradores para ações (‘call-to-action’) fáceis,
insignificantes e impotentes.
Os objetivos da campanha geralmente são
focados exclusivamente em inflar o percentual de participação, sem
necessariamente derrubar ou enfrentar o status quo. No final, a
transformação social é vendida como uma marca de papel higiênico.
O problema fundamental dessa abordagem
tecnocrática é que as métricas medem somente o que é mensurável.
O clicktivismo negligencia o que é mais vital para a revolução,
como as imensuráveis crises psicológicas internas e epifanias
pessoais das quais as grandes rupturas sociais são feitas.
A
história das revoluções atesta que o levante é sempre improvável,
imprevisível e arriscado. Logo, alguns pronunciamentos banais sobre
“democracia em ação” juntamente com uma petição on-line
não darão início a uma transformação social efetiva.
Como
Malcolm Gladwell pontuou recentemente, “ativismo que desafia o
status quo – que ataca profundamente a raiz dos problemas – não
é para os fracos de coração”.
O clicktivismo incita o receio de
se destacar da multidão, de se singularizar e de tomar uma posição
marcante, desencorajando, assim, ações mais drásticas. E como tal,
o clicktivismo nunca criará uma revolução social de fato. Pensar
que o fará é uma falácia que estamos alimentando.
O legado do clicktivismo está dando um reboot no
ativismo como o conhecemos. Está dando início a uma mudança de
paradigma na noção de transformação social e abrindo as portas
para uma nova geração de ativistas.
Esse rejuvenescimento é
encorajado por três insights táticos:
- revoluções são frutos de
epifanias; - a Internet é o melhor instrumento para provocar memewars;
- as ações ousadas do mundo real são a base indispensável de
qualquer mudança social.
Essa nova geração perdeu a confiança nas
discussões vazias dos gurus digitais e seus “10 passos para o
sucesso” . Abandonam as métricas, deletam logs de sites e ignoram
o analytics. Em seu lugar, a poesia apaixonada recupera a primazia.
O
desafio de provocar epifanias é a nova prioridade revolucionária.
Mas isso não significa que devemos fechar inteiramente nossos olhos
para o potencial da tecnologia.
Pelo contrário, a próxima geração de ativistas
irá prontamente reconhecer que a Internet desempenha um papel tático
crucial. Na batalha pelo sentido, a velocidade de disseminação de
bombas semióticas, emboscadas imagéticas e vírus cognitivos são
essencialmente estratégicos. Isso é uma memewar.
Ainda assim, a ação
no mundo real é a única forma de realizar alguma revolução
social. Clicar em um link nunca será o mesmo que ocupar as ruas.
Ser um ativista é
assustador. Toda transformação social é inicialmente repudiada,
afinal, a insurreição sempre começa com a desobediência. Momentos
antes da vitória, todo revolucionário sente um frio na espinha. E o
clicktivismo nos encoraja a evitar exatamente essas emoções, a nos
esconder por trás do mouse e a adotar a inércia do clique passivo.
O ativismo só
irá renascer quando os revolucionários encontrarem força através
da intensidade dos protestos e das emoções desencadeadas pela
participação em motim.
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Este artigo é uma livre tradução do texto original “Activism
after Clicktivism”, de Micah White