DevSecOps

14 fev, 2012

2012+ – Parte 01

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A aceleração dos processos gera uma reação em cadeia em que tudo parece correr rápido demais. Algumas coisas, no entanto, progridem continuamente de forma previsível, pouco importa a velocidade em que sejam vistas.

Em 1982, Godfrey Reggio apavorou crítica e público com seu filme Koyaanisqatsi, em que contrapunha a intervenção frenética do homem aos harmoniosos processos da natureza. Apesar de ser uma baita pancada e estimular a reflexão, o filme acabou sendo relegado a workshops pseudo-místicas de auto-ajuda, a cenografia em telão de balada e à estante de filmes “cult”, chatérrimos quando fora de contexto. Até que um doidão resolveu acelerá-lo e colocá-lo no Vimeo. O resultado você vê acima.

Da mesma forma que boa parte da mensagem ainda se preserva mesmo acelerada a 1552%, as tendências que listo na série de artigos que publico a partir de agora tratam de grandes correntes de comportamento que se manifestam o tempo todo, mesmo que a realidade cotidiana pareça estar a uma velocidade inalcançável. Vamos a elas:

1. Sobrecarga de informação

Não me canso de repetir a frase do Tio Marshall McLuhan, dizendo que corremos para o futuro com os olhos no retrovisor, pois teimamos em projetar o passado nos anos que virão. O termo acima é mais um desses exemplos, desatualizados hoje em dia. Ele vem de 1970 (OK, de um livro de tendências de 1970, mas mesmo assim) e se refere à dificuldade que as pessoas teriam para entender assuntos e tomar decisões por causa de muita informação. É um ponto de vista bastante explorado pela mídia, analisado inclusive por pesquisadores de respeito, como Barry Schwartz, em seu livro “O Paradoxo da Escolha“:

Sua lógica é bastante precisa, a ponto de levar a muitas dúvidas. A princípio, não há como contestar a dificuldade em se tomar decisões com tantas opções, mas até que ponto isso é “planejado” ou é simples reflexo de uma demanda de mercado cada vez mais segmentada, eu tenho as minhas dúvidas.

Mas o que mais me incomoda nesse conversê é seu ponto de vista REACIONÁRIO, feito o daqueles “gurus” de inovação que não usam FourSquare ou Instagram e adoram fazer vídeos de si mesmos achando tudo uma porcaria, no melhor estilo Pedro de Lara. Pense bem: qual é a opção? Reduzir a oferta de produtos e serviços para uns poucos privilegiados? Não faz o menor sentido. Acredito que até mesmo no Japão, que adora posar de inovador, dinossauros como Sony, Panasonic e Toshiba adorariam uma política de restrição que reduzisse as ofertas. Felizmente, o que ocorre é exatamente o contrário.

Há muita informação disponível, sem dúvida. Há muito mais informação do que seríamos capazes de consumir, ninguém duvida. Eu e a Tropicália mal éramos nascidos e o Caetano Veloso já dizia que o sol nas bancas de revista o enchia de alegria e preguiça, perguntando-se quem lia tanta notícia. Nunca se leu. Antigamente, quando havia pouca informação, todos recorriam à Grande Mídia – essa sim, com uma agenda ideológica bastante clara – para procurar o que pensar. Hoje que há fontes demais, a referência absoluta não existe mais. E isso é uma excelente notícia.

É inegável que a maior oferta de informação leve a uma confusão, mas isso é indício de uma transformação que está por vir. Mas transformações metem medo, pois levam a mudanças de comportamento e novos aprendizados. E isso incomoda muita gente. Ver essa multiplicidade espalhada por novos canais que pipocam feito cogumelos na chuva incomoda, incomoda, incomoda, incomoda muito mais. Daí é fácil escrever um livro rabugento, assertivo e argumentativo, baseado em informações tendenciosas, para fazer a cabeça de quem não está muito disposto a pensar. Nicholas Carr é um desses caras que serão esquecidos nos próximos anos. Não leu o livro dele? Não perca o seu tempo.

É melhor ler o livro do Clay Johnson, The Information Diet. Entre vários argumentos em que defende o consumo consciente de informação, o que mais gosto é o da batata frita: ela é incapaz de pular do prato de comida para dentro do seu estômago, entupindo suas veias com colesterol. Para que isso aconteça, é preciso comê-la. O mesmo acontece com a informação. Não há mal algum em saber quem é Michel Teló ou daonde voltou a Luiza, contanto que sua dieta não seja baseada nisso. Em minha opinião, quanto mais variada forem as fontes de conteúdo, mais ampla tenderá a ser a perspectiva. Mas isso é só a minha opinião.

Para encerrar o tópico, vale uma ressalva: verifique a fonte da informação. Na época em que as histórias vinham da Folha, da Globo, da Abril ou do Estadão, um erro de reportagem (também conhecido como “barriga”) era fácil de identificar. Quando a fonte da informação está perdida na rede, é preciso tomar cuidado com a origem de cada fato ou comentário para evitar a transmissão de boatos ou incorreções. Hoje que cada um é seu próprio editor, é preciso desconfiar de tudo. Até que uma nova tecnologia nos redima.

O que nos leva ao segundo tópico:

2. Percepção de tempo

Philip Zimbardo faz uma pesquisa interessante sobre a percepção do tempo em diversas culturas, que o pessoal da RSA fez a gentileza de resumir na animação abaixo (ainda bem, porque o livro não é muito bom e a animação praticamente esgota o tema).

O livro é uma pesquisa antropológica, maçante às vezes, viajante quando se mete a falar daquilo que não conhece, mas no geral bem esclarecedora. A não ser que você tenha algum interesse específico, não recomendo comprá-lo. Em geral, sua defesa é que os tempos verbais usados ajudam a transmitir conceitos e contextos. Algumas culturas tendem a se concentrar mais no futuro porque precisam planejar e outras no passado, para levantar a importância de seu legado.

Ao ler seus argumentos, pensei na nossa língua, que conta com três passados, subjuntivo e Futuro do Pretérito para explicar porque tantas ideias teriam sido fantásticas, enriqueceriam seus inventores e tornariam o mundo melhor se apenas este ou aquele fato não tivessem ocorrido. E, naturalmente, na Internet, em que só há espaço para um tempo verbal: o imediato. A reflexão me rendeu uma boa coluna para a Folha de S. Paulo e levantou uma preocupação: alguns comportamentos de risco, principalmente pelos mais jovens, são típicos de uma forma de pensar em que o Futuro vem por mágica e o único tempo relevante é o Presente.

É uma forma de pensar típica de ambientes de abundância com forte risco de decadência: baladas, países tropicais subdesenvolvidos, países com pouco investimento em educação e, naturalmente, o meio digital. É importante compreender o decorrer do tempo, o legado de determinadas conquistas e o processo para a descoberta de novas ideias, para que elas se tornem práticas e processos, não intervenções mágicas. Só assim será possível tomar a dianteira da inovação. Quando não há perspectiva de futuro ou noção de legado, o tempo se achata como uma timeline do Facebook:

Vale observar o ambiente decadente das baladas, o Eurotrash (que ainda persiste, apesar da crise econômica), a vida besta do consumismo publicitário (excelente em filmes como 99 Francs e o já manjado Diabo Veste Prada), o subdesenvolvimento dos nossos coronéis e de seus políticos de estimação, poderosos feito Yorkshires, a decadência Homer Simpson de um EUA obeso mórbido (mas com algumas esperanças para a nova geração) e todo o lixo que os Rafinhas e Danilos adoram vomitar travestido de irreverência, pois só assim o futuro estará ao alcance das mãos, não do cartão de crédito.

3. Real vs. Virtual

Não Microsoft, não: o Futuro não será lotado de iPhones e iPads nas paredes. Isso é o presente. Vocês não aprendem, né? Cadê o Kinect nessa visão de Futuro?!?!?

Aí o pessoal faz piada e vocês ficam sentidos. Mas tenham dó, né?

A Microsoft não está sozinha: a capacidade de pagar pau para o iPhone que as empresas que deveriam investir em inovação têm é assombrosa. A culpa deve ser – só pode ser – dos publicitários, apaixonados por seus iPetrechos, incapazes de criar algo verdadeiramente novo. Veja só:

A mudança é mais sutil e não está nesse tipo de interface de toque. Ela, aliás, é só o começo. Máquinas como o Kinect são impressionantes pela capacidade que têm de ampliar a interação para muito além do imaginado. Sensores de calor, movimento, luz e som estão mudando completamente a forma com que interagimos com o mundo à nossa volta.

A maioria das pessoas gesticula ao falar ao telefone. Provavelmente porque sabe que a voz não é suficiente para exprimir um ponto de vista. As interfaces ainda são muito parecidas com a desktop do computador, provavelmente porque essa é a forma de interação humano-computador mais pesquisada, testada e conhecida. Mas está longe de ser a única. Há muita coisa nova por vir nas próximas interfaces.

O mundo “analógico” está perdendo o sentido. Estar fora da rede é possível, da mesma forma que é possível estar sem eletricidade, saneamento básico, transporte, pasteurização ou água quente. Mas… para quê? Resistir a ele – tecnofobia – é tão tolo quanto adorá-lo – tecnofilia. É importante analisá-lo bem para poder tirar de cada nova ideia um parâmetro para orientar a ação.

Chega por enquanto. Continuo no próximo artigo.

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Artigo publicado originalmente em Luli Radfahrer