Android

5 nov, 2014

Por que os designers não levam o Android a sério

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Caso você tenha conversado comigo nos últimos meses, já me ouviu explicar que acho que o Android é a plataforma dominante da próxima década. Existem duas razões principais.

Adoção

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(Gráfico via Asymco.)

O Android está engolindo o mercado a uma taxa sem precedentes. Agora, isso não significa que seja uma corrida de um só cavalo. Essa participação de mercado está chegando à custa de feature phones, Symbian e Blackberry – não parece estar tirando muito do iOS. Nem vamos, necessariamente, acabar com uma divisão semelhante à do PC/Mac: o mercado total de aparelhos é muito maior do que de computadores. Até agora, o mercado parece grande o suficiente para os dois jogadores mais importantes.

No entanto, os padrões de crescimento do Android são o que lhe dão tanto poder. O Android domina totalmente os mercados emergentes. Eu não sou nenhum analista ou especialista do mercado global, mas está claro que as grandes empresas de tecnologia reconhecem isso, e muitos lançaram Androids mais simples para atender a esses mercados. Enquanto os países desenvolvidos estão se aproximando da saturação do smartphone, existe um enorme potencial de crescimento no resto do mundo. A curva vai continuar e é provável que o Android chegará uma proporção maior da humanidade do que qualquer tecnologia comparável, se já não tiver feito isso.

Proliferação de dispositivos

E isso porque estamos falando apenas de smartphones. A medida que o custo de processadores e as redes caem, uma série de dispositivos minúsculos, baratos e conectados vão surgir dos laboratórios de P&D direto para as lojas. Chame isso de a Internet das Coisas se quiser – eu prefiro “dispositivos cooperativos”.

Esses mesmos dispositivos minúsculos, baratos e conectados vão precisar de um sistema operacional. De preferência um que seja gratuito (monetariamente gratuito, pelo menos), de confiança, bem conservado e que tenha boa interoperabilidade.

Não será o iOS, já que a Apple parece não ter interesse em licenciá-lo para hardware de terceiros. Em vez disso, eu espero que eles lancem um ecossistema Apple-only de dispositivos cooperativos. (Eu poderia argumentar que eles já estão quase lá) Uma vez que eles possuem a pilha completa, eles seriam capazes de oferecer primeiro excelentes experiências do tipo IoT, demonstrar valor para os consumidores e, portanto, gerar um mercado mainstream. Eles precisariam de muito dinheiro para fazer isso – felizmente, eles têm.

Eu também não acho que vai ser outro sistema operacional. Os outros (Windows, Windows Phone, Firefox OS, Linux etc.) ficam muito para trás, ou têm trajetórias retrógradas. Isso pode mudar, mas como o alcance global é lento, eu acho que anos passarão antes de surgir outro grande player no setor de sistema operacional.

Eu também não acho que seja o navegador web. Em teoria, o navegador cumpre os critérios – barato, ubíquo, interoperável – e a comunidade web adoraria que ele ganhasse. Mas, sem rodeios, ele está perdendo em termos de capacidades, desempenho e experiência do usuário, onde os aplicativos nativos estão muito à frente. Os navegadores estão melhorando, e finalmente aproximando-se em termos de acesso ao hardware, mas se o navegador está para se tornar One True Platform, será necessário superar as deficiências sistêmicas significativas. Um navegador permanentemente tentando se manter atual será sempre uma camada na pilha de tecnologia adicional, potencialmente redundante. Se um único sistema operacional acaba rodando em mais 90% dos dispositivos conectados do mundo, por que se preocupar com software escrito para o navegador?

Enfim, eu escrevi este tweet

O Android é a plataforma dominante da próxima década. Por que os designers não estão prestando mais atenção? (via @asymco)

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…e recebi uma tonelada de respostas. Eu não vou colocá-las aqui ou citar nomes – Eu respeito muito as pessoas que respoderam, e eu vou ser muito cruel ao rebater seus argumentos.

As respostas caíram em duas grandes categorias:

1. O Android é difícil

Esses argumentos eram familiares: a fragmentação é uma chateação, o cenário é muito fluido, o Android não tem uma estética de design, a interface de usuário do Android é pobre. Eu acho que a falta de familiaridade com Android desempenhou um pequeno papel nessas respostas. Kitkat está anos-luz à frente da era Gingerbread, e se você ainda não experimentou o Android recentemente, vale a pena dar uma olhada. Eu não concordo muito com a afirmação de Stammy de que o Android é melhor, mas está certamente muito melhorado.

A fragmentação é, claro, a peste negra do projeto Android, e é certamente um desafio para designers e engenheiros. Mas a própria palavra reflete uma questão sutil de enquadramento. Não é difícil pensar em sinônimos positivos: fragmentação como escolha; fragmentação como diversidade.

Como os web designers têm aprendido ao longo dos últimos anos, a diversidade de dispositivos é natural, bem-vinda e gerenciável. Muitas técnicas de web design responsivo – por exemplo, layout fluido, breakpoints e independência de resolução – são princípios essenciais do projeto Android. Na verdade, eles são tratados de uma forma tecnicamente mais profunda no Android do que na web.

O design do Android é realmente mais difícil do que o do iOS, na medida em que oferece menos restrições. Mas qualquer designer qualificado, com um pouco de esforço, pode lidar com isso. Minha interpretação para esta classe de respostas é a simples preguiça, e se o Android força os designers a deixar de lado uma mentalidade pixel-perfect e adotar abordagens que se adequam a um mundo diverso, então isso não é coisa ruim.

2. Os comportamentos dos usuários são diferentes

As outras respostas foram, em sua maioria, variações sobre o tema que os usuários do Android não pagam por apps, eles não têm planos de dados, você não pode rentabilizá-los com facilidade e os designers são todos usuários de iPhone e realmente não entendem os usuários do Android.

Esta classe de respostas me incomoda mais do que a primeira.

Economicamente, na melhor das hipóteses, parece uma visão pequena. Os modelos de receita para os produtos digitais são fluidos, e não pode ser um bom negócio simplesmente descartar uma base de usuários tão significativa. Os métodos adequados estão por aí: os 450 milhões de usuários mensais do WhatsApp (a maioria usa Android) estão certamente dispostos a pagar por algo que adicional valor real às suas vidas.

É importante lembrar também que não estamos projetando produtos só para hoje. A estratégia de produtos também está procurando atender ao mercado que existirá nos próximos anos. Mesmo em mercados emergentes, os planos de dados estão chegando, e a receita não estará muito atrás.

Socialmente, excluir os usuários do Android parece quase prejudicial. Diferente de “Android ser difícil”, não se trata de cerca de mera conveniência; é um julgamento de valor sobre para quem vale a pena projetar. Falando de forma bem direta e impiedosa, a raiz do problema é que “os usuários do Android são pobres”.

Espero sinceramente, dada a retórica da tecnologia em mudar o mundo e romper hierarquias ultrapassadas, que nós realmente não pensemos somente que aqueles com potencial de receita são dignos de nossa atenção. Um designer tem o dever de ser empático; entender e abranger as pessoas que não são como ele. Um grupo de donos de dispositivos diferentes para a elite de design não é uma razão válida para negligenciar suas necessidades.

Eu reconheço que tenho uma postura bastante rara, dada a ideologia que envolve as questões de plataforma: eu não me importo com qual plataforma “ganha”. Sou um usuário muito feliz de iOS, Android e web. Espero que este artigo possa perturbar algumas pessoas que acreditam que sua abordagem é a melhor, porém o meu único critério de tecnologia bem-sucedida é que ela enriquece a vida do mundo. Neste momento, o Android me parece o melhor veículo para fazer isso em maior escala e acho que os designers estão enganados se desconsiderarem o seu potencial.

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Artigo traduzido pela Redação iMasters com autorização do autor. Publicado originalmente em http://www.cennydd.com/blog/why-dont-designers-take-android-seriously