Carreira Dev

28 mai, 2019

Devs fora do eixo – como desenvolver carreira fora do eixo Rio/São Paulo

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Beto Muniz nasceu em Vila Velha, no Espirito Santo, mas foi criado no interior de Minas Gerais. O desenvolvedor mora em Belo Horizonte há sete anos. Mesmo sendo uma das maiores cidades do Brasil, BH está fora do principal eixo tecnológico do país. A maior parte dos Devs está concentrada no estado de São Paulo.

Não é à toa, que grande parte dos eventos para devs está em São Paulo. Beto começou a carreira quando se mudou para Belo Horizonte e só permanece na capital mineira, porque trabalha remotamente para uma empresa de Londres. Ele é bastante envolvido com a comunidade de Devs de BH. Por isso mesmo, entende que há problemas na forma como o mercado se relaciona com seus profissionais.

“Por atuar fora do Brasil, me questionam bastante sobre meu interesse em atuar no Brasil. A verdade é que meu maior sonho era trabalhar para empresas brasileiras, e ainda estou esperando uma bem legal aparecer”, diz Beto. Mas ele é realista: “A realidade é que sou muito mais valorizado lá fora, financeiramente, e principalmente, profissionalmente. Acredito que essa subvalorização de nossa mão de obra no Brasil, que inclusive é muito valorizada lá fora, se dá pela cultura mercadológica de exploração, que historicamente o Brasil herdou sobre o trabalho em si.”
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Ele fez o comentário se referindo “não só ao setor de Tecnologia da Informação”. “O que me entristece, é que analisando profundamente, não vejo muito interesse em mudar esse cenário para melhor”, completa Beto.

Hoje, a internet leva conhecimento a qualquer lugar e costumamos dizer que distâncias são encurtadas por ela. Por isso mesmo, Beto diz que não há qualquer diferença entre os profissionais de dentro ou de fora do eixo. “Existem profissionais excepcionais em todos os lugares do Brasil. O problema é a forma que utilizamos e valorizamos estas pessoas. Conheço profissionais morando em cidades com 11 mil habitantes e trabalhando de suas casas para gigantes mundiais do setor de tecnologia”, diz Beto.
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Eventos para Devs

Os maiores eventos para devs acontecem, principalmente, em SP. Como levar, então, esse conhecimento, as novidades e discussões para outros estados? Beto responde que os organizadores desses eventos precisam pensar nas outras regiões.
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“Quem ‘faz acontecer’ em SP, deve se preocupar também em ‘fazer acontecer’ em MG, ES, BA, MA, entre outros estados. E não digo em trazer tais eventos apenas fisicamente, mas também no que diz respeito ao suporte das comunidades locais. Morei entre 2014 e 2015 em SP, e mesmo assim continuei atuando no Minas Dev, ou seja, posição geográfica exige outras metodologias de gestão, mas não é motivo para ficar parado”, afirma Beto Muniz.
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Ou seja, é preciso se manter conectado às comunidades, independentemente das distâncias. Para Beto, as comunidades são Fundamentais. “Hoje, temos um cenário, pelo menos em Belo Horizonte, muito mais sólido de comunidades de tecnologia. Ainda há muito para melhorar, porém, o Minas Dev representou uma quebra de cultura do mercado e até mesmo do conceito das comunidades regionais”, explica.
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Muniz é um dos fundadores e atualmente líder do Minas Dev. Ele já fez parte da organização de vários eventos, como FEMUG-MG, devbeers Belo Horizonte, entre outros. É Google Developer Expert de Tecnologias Web, programa da Google que destaca profissionais atuantes em determinadas comunidades. “Para mim, estar envolvido em comunidades profissionais é transcender o aspecto profissional e chegar no limiar da solidariedade humana”, explica o desenvolvedor.
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Ele afirma que estar envolvido com as comunidades, “é prazeroso se feito com amor e dedicação. E apesar de ser muito difícil devido ao baixo suporte e baixo interesse do mercado local, vivo e respiro comunidades todos os dias”. E Muniz não se arrepende de nada. Após anos envolvido, diz que vê o real impacto na vida dele e na vida de muita gente.
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Andrêza Leite

A desenvolvedora Andrêza Leite é outra Dev Fora do Eixo. Ela nasceu em Belém/PA e mora em Recife/PE. Diz que trabalhar com TI em Recife contribui muito para o desenvolvimento profissional no setor tecnológico. Ela explica que em Recife há o Porto Digital, que conta com um ecossistema produtivo de Tecnologia da Informação “riquíssimo”, segundo Andrêza. O local é considerado um dos principais parques tecnológicos do Brasil.
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Foto do Porto Digital, retirada do site oficial.
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Andrêza afirma que estar próximo dos grandes centros produtivos no setor tecnológico era um desejo desde a graduação. Quando ainda morava no interior do Pará, na cidade de Santarém (região do Tapajós), ela conta que não existiam muitas oportunidades de contratação e desenvolvimento de carreira. Porém, ela sempre se envolveu em projetos acadêmicos que deram oportunidade de adquirir experiência e de complementar a formação superior.
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Carência em Tecnologia

Andrêza é Professora do Departamento de Computação da Universidade Federal Rural de Pernambuco (DC/UFRPE) e da Especialização em Ciência de Dados e Analytics da Escola Politécnica da Universidade de Pernambuco (Poli/UPE). A desenvolvedora conta como é a realidade das regiões que sempre estiveram menos assistidas por parte do poder público. “Como filha do norte, eu ainda tenho contato com regiões muito remotas e carentes de tecnologia. Claro que a internet aproxima as pessoas e facilita o acesso ao conhecimento, mas as oportunidades disponíveis nos grandes centros não se comparam àquelas que chegam nestes lugares mais remotos e isso gera um impacto direto na formação e experiência dos profissionais”, revela.

Para tentar suprir um pouco essa diferença entre as regiões, ela defende que as empresas precisam realizar grandes eventos de maneira itinerante e, ainda, permitir o acesso à estes eventos com transmissão online, que facilitaria a participação de pessoas de outras regiões.

Um alento, na visão de Andrêza, são as comunidades. “
A comunidade é o maior ponto de apoio que podemos encontrar para nos mantermos ativos. É importantíssimo conviver com pessoas que possuem os mesmos interesses pois, assim, é possível fomentar o desenvolvimento dos profissionais por meio do compartilhamento de conhecimento”, afirma.

Ela é diretora do Women Who Code Recife e diz  sempre ter participado de comunidades. Gerenciar uma comunidade é muito desafiador, diz. “O voluntariado requer, principalmente, um grande amor pelo trabalho, pois é ele que nos dá forças para continuar colaborando com nossos pares e mantendo a comunidade viva”, acrescenta.
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Ana Paula Gomes

Ana Paula está totalmente fora do eixo. Ela é engenheira de software na Thermondo, uma startup alemã da área de energia. Nasceu em Feira de Santana, interior da Bahia e, atualmente, mora em Berlim, na Alemanha. Ana diz que queria ser advogada, pra conhecer melhor as leis e ajudar as pessoas.
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Porém, quando terminou o ensino médio, fez alguns vestibulares sem sucesso e decidiu ouvir o conselho da mãe e fazer o curso técnico em Informática. Ela ficou encantada pela capacidade de criar coisas com a programação. Em Feira de Santana existia poucas empresas de desenvolvimento, no estilo software house.
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Naquela época, quase não existiam eventos ou meetups. Hoje em dia, segundo Ana paula, as coisas mudaram. Comunidades como GDG FSA, ProgramAda e DevFSA estão movimentando os grupos. Entre os desafios atuais, ela acredita que esteja desenvolver a comunicação por estar morando fora do Brasil. “Entretanto, sendo uma mulher programadora, lidar com o sexismo, ainda existente em vários ambientes de trabalho, e as tentativas de assédio ainda fazem parte do dia a dia, infelizmente”, afirma Ana Paula.
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A boa notícia, diz ela, é o fato de não haver diferença entre profissionais do eixo RIO/SP e o que estão fora dele. “O que eu vejo é uma concentração de empresas nesses estados, principalmente em São Paulo. Acredito que com o trabalho remoto, esse é um cenário que está mudando. Além disso, outros estados oferecem boas empresas para trabalhar, sem precisar perder 2 horas no trânsito, por exemplo. Belo Horizonte e Recife ilustram isso bem. Recife tem o porto digital e Belo Horizonte, além de um ecossistema rico de startups e comunidades, tem empresas grandes como o Google por lá”, esclarece.
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iMasters – Os maiores eventos para devs no Brasil acontecem, principalmente, em SP. Como é na sua região?
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Ana Paula Gomes – Em Feira de Santana surgiu o maior JS Day do Brasil, sendo exportado para outras cidades mais tarde. Salvador, que fica a 1 hora de Feira, passou a receber a Campus Party também.
iMasters – Na sua opinião, qual a importância das comunidades para os desenvolvedores que estão fora do eixo Rio/SP?
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Ana Paula Gomes – Em qualquer lugar, as comunidades de desenvolvimento são essenciais para a carreira de uma pessoa desenvolvedora. Através dos eventos, nos atualizamos, aprendemos como compartilhar conhecimento e também conhecemos pessoas, empresas e projetos.
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iMasters – Você participa de comunidades? Como é participar/gerenciar essas comunidades na sua região?
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Ana Paula Gomes – Participo sim. Em Berlim, sou organizadora do PyBerlin. Nesse aspecto não há diferença alguma das comunidades que participei no Brasil. Utilizamos o meetup.com para organizar os eventos e vamos entrando em contato com quem se voluntariou para palestrar ou receber a comunidade. Pelo o que acompanho, acredito que em Feira de Santana seja bem parecido.