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25 nov, 2008

A crise financeira e o mercado de TI

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* Artigo feito com a colaboração de Fabio Rodrigues, Editor-Chefe da Redação iMasters.

Tudo começou assim

Tudo começou no mercado imobiliário. Milhões de americanos, diante de juros em queda e crédito abundante, resolveram pegar empréstimos para adquirir seus imóveis. A lei da oferta e da procura vigorou: muita procura = valorização dos imóveis.

Entretanto, uma bolha imobiliária acabou se formando e muitos resolveram refinanciar seus bens, pegando dinheiro na troca. Esse dinheiro foi aplicado no mercado de consumo, e muitas daquelas pessoas que pegaram empréstimos não sanaram suas dívidas.

Resultado: a valorização dos imóveis desabou, e milhões de pessoas se viram com uma dívida maior do que o valor dos imóveis que detinham e acabaram por desistir deles.

Como conseqüência, esses créditos imobiliários, revendidos a bancos de todo o mundo, levaram prejuízos enormes, inicialmente, à economia estadunidense e, em seguida, à economia global.

Em setembro, as bolsas de valores mundiais começaram a despencar. No dia 6 de outubro, a Bovespa chegou a operar em queda de 15%. Ainda houve outro baque no dia 22 do mesmo mês. E mesmo o Brasil vivendo um dos seus melhores momentos econômicos, não iria ficar imune ao caos: o mecanismo “circuit breaker” foi acionado várias vezes a fim de tentar minimizar perdas.

A indústria tecnológica não escapou

Diante desse cenário dantesco, a indústria da tecnologia também foi fortemente atingida.

Salvo algumas exceções, as empresas desse setor tiveram queda média de 8% no valor de suas ações.

No final de setembro, o Congresso norte-americano rejeitou o pacote de ajuda às instituições financeiras, o que refletiu diretamente no mercado brasileiro e nas empresas de tecnologia. No final de setembro, a Bovespa registrou queda de mais de 9% e foi acompanhada pelas companhias de TI listadas na bolsa, que tiveram queda média de 8% no valor de suas ações.

Entre as empresas de tecnologia, a Apple, no auge da crise, chegou a ter queda de 17,42% nas suas ações. A B2W, que reúne as operações online do Submarino e da Americanas, teve desvalorização de 16,49% no valor de mercado. Em seguida veio a Bematech, com perdas de 10,92% e ações cotadas a 5,30 reais cada.

Empresas do setor de internet também sofreram. O UOL teve perdas de 2,87%, enquanto a Ideiasnet desvalorizou 2,94%.

No final de setembro, a Totvs teve queda de 8,02%, com cada ação cotada a 46,40 reais. A fabricante de computadores Positivo apresentou perdas de 8,13% e a Itautec teve queda de 8,78%.

Tendo em vista que todas as ações das empresas listadas na Bovespa sofreram perdas, com a Totvs não foi diferente. Porém, mesmo tendo sofrido perdas, José Rogério Luiz, Vice-Presidente Executivo e Financeiro da Totvs, afirma que, de acordo com um levantamento divulgado na imprensa no início de novembro, das 100 empresas que ingressaram no mercado de capitais há três anos, apenas nove tiveram valorização acima do valor inicial, e a Totvs ficou entre elas. “As ações da Totvs, como as das demais empresas, foram atingidas pela crise, mas numa dimensão menor, devido ao seu desenvolvimento no posicionamento de mercado, que é de liderança no software de gestão”.

Impactos

O impacto direto no mercado de TI, segundo Sandra Maura, diretora executiva da TOPMIND, será pouco. Ela explica o porquê: “o que impulsiona o crescimento do mercado de trabalho é o aumento do consumo da população. O consumo mais intenso aumentará a produção e também a necessidade de novos funcionários para atender a essa demanda. Caso não haja aumento no consumo devido à retração da economia, não há a necessidade do aumento da produção e do quadro de funcionários”.

A executiva enfatiza que, mesmo que algumas empresas já tenham atingido o patamar de corte de funcionários, o mercado de profissionais de TI é muito escasso, logo o profissional qualificado não deve sofrer com a crise.

Quando indagada sobre a redução no ritmo das contratações no mercado de TI, a diretora executiva da TOPMIND acredita que o número de contratações de profissionais na área deve continuar em ritmo de crescimento. “Os números do International Data Corporation são muito promissores, pois indicam que no próximo ano serão criados 630 mil empregos para a área de TI na América Latina; desses, 296 mil (47% do total) serão no Brasil”, salienta.

Em contrapartida, Roberto Carlos Mayer, presidente da Assespro-SP e diretor da MBI, acredita que o setor de TI vai enfrentar dois impactos imediatos: o aumento de custo, principalmente para fabricantes de hardware, de componentes, equipamentos eletrônicos e demais empresas que dependem da importação de materiais, e a redução dos investimentos.

“O recente aumento do dólar eleva os custos de todos os produtos vindos de outros países, o que pode encarecer os preços internos. A manutenção deste cenário dependerá do desenrolar da crise americana”, explica Mayer. Em relação à redução dos investimentos, ele acredita que as empresas desenvolvedoras podem adiar planos e “como se diz no mercado financeiro, ficarão em compasso de espera`”.

Em relação aos impactos na empresa, o executivo da Totvs acha que ainda é cedo para se ter uma dimensão do desenrolar da crise. Na companhia não houve desaceleração ou redução no ritmo de contratações, principalmente porque, recentemente, a empresa incorporou a Datasul, o que fez com que algumas necessidades de mão de obra tenham sido, e continuem sendo, supridas.

O que fazer?

Para Sandra Maura, o melhor que as empresas de TI têm a fazer no momento é reduzir os custos operacionais. “Se a empresa conseguir oferecer soluções que foquem na redução de custos operacionais e na padronização dos processos, a necessidade por profissionais para dar o suporte ao ambiente será menor”, atesta a executiva.

Em relação à alta do dólar, Sandra acredita que afeta mais a negociação de contratos para a compra de softwares e hardwares fabricados fora do Brasil. Nesse caso, a saída é optar por fornecedores internos ou renegociar os contratos caso a empresa tenha optado por um fornecedor de fora.

Quanto ao profissional de TI, ela afirma que esta é a chance de ele mostrar o seu valor: “a sua versatilidade será muito valorizada, o que significa se adaptar a diferentes projetos e funções, ter diversas qualificações, fluência em pelo menos dois idiomas – além de um português correto etc”.

Para Roberto Carlos Mayer, as perspectivas para a economia brasileira continuam positivas, e o mercado de TI no Brasil ainda possui um grande espaço para crescer. “Podemos reduzir o nosso ritmo de expansão por conta do cenário internacional, mas a demanda local deve impedir a retração. O momento é de cautela e de avaliação de todas as oportunidades”.

Já José Rogério Luiz, da Totvs, acredita que duas questões precisam ser avaliadas pelas empresas: como elas estão operacionalmente e como está o valor de suas ações. “A operacionalidade é controlável, por exemplo, pelo desenvolvimento. Mas não se controla o mercado”. O Vice-Presidente Executivo e Financeiro da Totvs acrescenta que, para enfrentar essa situação, “é preciso reforçar a capacidade operacional de entrega de resultados se aproximando dos clientes, além de, a partir de agora, ter uma postura criteriosa com os custos, passando longe da irresponsabilidade”.

Adriano Filadoro, consultor de TI e diretor de tecnologia da On Line Brasil, afirma que, mesmo em meio à “crise”, grandes fabricantes estrangeiros – especialmente asiáticos – estão conscientes da importância de nacionalizar a produção de equipamentos. Além de estreitar as relações bilaterais, deverá haver geração de empregos, redução do preço final dos produtos, aceleração no processo de entrega, tanto para o Brasil como para a América Latina, e aperfeiçoamento do atendimento pós-venda. “É esperar para ver”.

Considerações finais

Depois da tempestade costuma vir a bonança, certo? Nem sempre. Após os Estados Unidos e a Europa terem anunciado medidas para apagar o incêndio dos mercados financeiros, no dia 13 de outubro o mercado financeiro mundial pareceu se acalmar, registrando altas nas bolsas globais e, aparentemente, acalmando investidores. A Bovespa abriu em alta de 8,75%.

Mas apenas dois dias depois, as bolsas voltaram a cair. No Brasil, a Bovespa chegou a registrar queda de 13,85%. Essa queda foi decorrente das perspectivas negativas em relação ao mercado dos Estados Unidos, que pode estar entrando em uma recessão e cujas vendas no varejo tiveram recuo, e ao europeu, em que alguns países têm registrado queda de PIB e desaceleração do crescimento econômico (casos de França e Alemanha, respectivamente).

Atualmente, uma palavra define a situação do mercado financeiro mundial: oscilação. As bolsas têm operado com instabilidade devido ainda à falta de segurança em relação ao mercado norte-americano. Além disso, os mercados europeus também têm entrado em recessão, tendo a Alemanha, maior potência européia, ter declarado oficialmente estar em crise na primeira quinzena de novembro.

O momento é de cautela e paciência. O executivo da Totvs resume bem a maneira de se encarar a atual situação: “A melhor forma de tratar uma crise é respeitando-a”.