Acessibilidade

1 jun, 2009

Um site acessível para cegos é necessariamente acessível para surdos?

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Muito se fala de acessibilidade digital para deficientes visuais, até mesmo o decreto de Lei brasileiro Nº5.296
faz menção disso:

“todos os portais e sites da administração pública
deverão ter obrigatoriamente seus conteúdos acessíveis para pessoas
portadoras de deficiência visual, garantindo-lhes o pleno acesso às
informações disponíveis”

Mas e as outras deficiências? Tornar um site
acessível para deficientes visuais é o suficiente para atender a todas
as pessoas com necessidades especiais?

Por um lado, isso pode
até ser verdade, afinal, o deficiente motor e o visual normalmente
interagem com as páginas de um site através do teclado. Seguindo essa
lógica, ao criar uma página acessível e fácil de usar mesmo sem o
mouse, ou seja, navegando apenas com o teclado, poderemos dizer então,
que um site acessível para deficientes visuais também é para
deficientes motores.

Mas será que essa lógica pode realmente
garantir que sites acessíveis para deficientes visuais, também sejam
para deficiências motores em suas mais diferentes necessidades?

Trocando um pouco de foco, será que essa mesma lógica também é valida para os deficientes auditivos?

Não
seria melhor fazer testes com diferentes usuários e, a partir dos
resultados, definir quais são as principais características que devem
ser aplicadas para atender a todas as necessidades especiais?

Quando
falamos de acessibilidade digital para surdos, o principal problema que
nos vem à mente é a falta de legendas em filmes, vídeos e animações,
transcrição em texto de artigos e conversas gravadas e disponibilizadas
via podcasting, etc.

O problema é que, além dessas limitações
mais aparentes, existem outras barreiras que não são assim tão óbvias
e, por isso, são ignoradas e deixadas de lado.

Um texto do português José Pedro Amaral, surdocego – surdo total e com baixa-visão – bi-implantado na lista de acessibilidade do Yahoo, diz o seguinte:

“Fazer a
comparação cego/surdo é um pouco antagônica… O cego pode ouvir, por
isso cria registros corticais que, digamos assim, podem ser entendidos
como que “o esqueleto” de suporte para que uma estrutura lingüística e
fonética se possa formar. Depois desta, e só depois, é que é feita a
alfabetização da pessoa cega através do Braille; o que com a pessoa
surda não poderá acontecer”

Como
colocou o José Pedro, o deficiente visual aprende primeiro o português
para só depois aprender o braile. Já o surdo, aprende a língua
brasileira dos sinais (Libra) e depois o português. O grande problema
continua sendo a falta de informação, principalmente dos profissionais
da educação… Por pura ignorância no assunto e baixa capacitação
profissional, pensam que o surdo é menos capaz.

Em resposta a esses e outros “preconceitos“, apresento a frase – ou slogan – da minha escola de samba, o Salgueiro: nem melhor, nem pior, apenas diferente.

Infelizmente
a humanidade ainda não aprendeu a lidar com as diferenças e tem muita
dificuldade em compreender o desconhecido, o diferente, o novo.
Mudanças também não são bem-vindas em sua maioria e, parafraseando o
filosofo Heráclito: “Os cães ladram para o que não compreendem“. Além das escolas e universidades, infelizmente essa dificuldade também se reflete na maioria das empresas, associações, etc.

Para
agravar o problema da acessibilidade, a língua de sinais é bastante
limitada se compararmos com o português. Se muitas vezes, pessoas sem
nenhum tipo de deficiência têm dificuldades de entender um texto
complexo, imaginem um surdo que não teve acesso a uma educação
eficiente as suas necessidades.

“é importante que as pessoas
surdas tirem cursos superiores, caso contrário os “ouvintes” vão
continuar a pensar que temos menos capacidades” António
Pisco, ficou surdo aos 18 anos e atualmente cursa 2.º ano do curso de
Educação Física e Desporto na Universidade Lusófona de Humanidades e
Tecnologia.

Fica mais fácil de entender as diferenças com exemplos, como esse texto retirado de uma mensagem de Edson Constantino na lista de acessibilidade do Yahoo:

“Os
motivos são diversos, o fato é que a conversão de palavras comuns, como
logradouro e filiação, para libras é complicada e quando o surdo se
depara com elas em formulários é um problema… além disso ainda
existem as metáforas que são difíceis de serem explicadas ao surdo,
tipo caiu o dinheiro na conta…para o surdo cair é cair de tombo”

Pela
limitação natural da língua dos sinais em representar todas as palavras
do nosso rico português, se o texto for rebuscado, obscuro ou complexo,
tornar-se-á uma barreira natural para acessibilidade.

Não entendeu? Tudo bem, então não deixe de ler a história do lobo mau e da chapeuzinho vermelho produzida pelo professor surdo-mudo Francisco Goulão.
O mais bacana dessa história é que ela é dividida em duas, na primeira
coluna é contada em português e na segunda, em língua dos sinais e com
a sua tradução literal para o português.

Ao
ler essa historinha, “minha ficha caiu” – olha o uso de mais uma
metáfora. Mas com ajuda do Mestre, as diferenças entre as línguas
ficaram muito mais claras.

Conclusão:
a única solução para atender a surdos e “troianos” e, por tabela, todos
usuários, é aplicando a boa e velha receita de bolo: quanto menos, mais. Ou seja, se podemos simplificar, para que complicar?

“Complicar o simples é fácil. Criatividade é tornar o complicado em simples” Contrabaxista Charles Mingus

Dica de software:

  • software que transforma o texto escrito em uma animação para a linguagem brasileira de sinais. Dica enviada por: Walmar Andrade – www.fatorw.com
  • Blog do Professor surdo/mudo Francisco Goulão.