A inovação é a bola da vez no Brasil. No governo, o ministro de C&T só fala em inovação e na sua mais recente aposta para estimulá-la, a Embrapii. Nas empresas, inovação é palavra de ordem para quem quer se manter em um mercado tão competitivo. Nos centros de pesquisa, se respira inovação. Nas startups, inovar é objetivo e necessidade para que elas se destaquem. Por fim, nas universidades, inovação nem sempre é a finalidade, mas é lá que estão algumas chaves para ela. Neste artigo, veremos qual o papel de cada um dos elementos que compõe o ecossistema da inovação. Além disso, veremos como eles se correlacionam no Brasil.
A palavra inovação pode ser interpretada de diferentes maneiras. Neste artigo, vamos considerar inovador a criação ou a melhoria de um produto ou processo relacionado a software e que agrega valor para os clientes. Silvio Meira, cientista chefe do C.E.S.A.R. no Recife, mostra em sua série sobre educação empreendedora que a tarefa não é simples, envolvendo inúmeras variáveis. Meira também apresenta uma definição para um novo negócio inovador que possibilita compreendermos a amplitude da complexidade.
novo negócio inovador é um que muda [ou está tentando mudar] o comportamento de agentes, no mercado, como fornecedores e/ou consumidores de produtos e serviços. por esta definição [tirada de peter drucker], posso criar um novo negócio inovador alterando comportamentos na minha cadeia de valor de entrada, de saída ou em ambas. e devemos observar que negócios são inovadores em contextos; e contextos são temporais, geográficos, sociais, demográficos, às vezes de modos e modelos de uso, consumo e precificação…
Em seguida, conheceremos o papel dos principais elementos que compõe o cenário de inovação brasileiro para depois entendermos como eles interagem.
Vamos começar compreendendo a função do governo no que diz respeito à inovação. A palavra-chave aqui é “incentivo”. O governo tem que incentivar a indústria a inovar. Além disso, ele deve promover um ambiente político, econômico e institucional apropriado para o desenvolvimento acontecer. Outra interpretação é apresentada por Meira: para ele, o governo deve ter um papel de investidor na educação e de criação de oportunidades, deixando depois o caminho livre para as empresas. Contudo, no Brasil o problema é sério. Atualmente, os investimentos ínfimos do governo em inovação são de 0,61% do PIB, enquanto que a indústria consegue ser pior, investindo 0,55%. Estudos mostram que, em países desenvolvidos, o setor privado responde pela maior parcela dos investimentos nessa área. O governo, ciente dessa necessidade, pretende virar o jogo com auxílio da Embrapii.
Outro ator nesse ecossistema são as universidades públicas. Para quem não sabe, elas funcionam tendo como base o tripé pesquisa, ensino e extensão. Sendo que a pesquisa é a área responsável pela geração de conhecimento; as novas descobertas são retransmitidas através do ensino, direcionado aos universitários; e a extensão é o contato das universidades com a sociedade, a fim de ultrapassar as barreiras teóricas da sala de aula, dando vida prática ao que foi aprendido. Desse tripé é a pesquisa que possui grande ligação com a inovação. Apesar de as pesquisas realizadas não terem, geralmente, o objetivo de criar ou modificar um produto ou processo, podemos considerá-las uma etapa importante para alcançar a inovação. Contudo, nossas universidades sofrem de um mal que prejudica a realização de pesquisa de valor, como é lembrado por Meira aqui:
…os professores [aqui] são contratados para dar aula [não há concurso para pesquisador, mas para professor…], mas todos os incentivos da carreira são para fazer pesquisa ou, como diriam alguns, antes fossem, são mesmo é para publicar. resultado? o Brasil progride célere no número de artigos publicados, sem que se note um impacto desta performance na economia.
São dois os problemas. O primeiro é que não existe contratação de pesquisadores nem nas universidades tampouco no mercado. O segundo é o foco na quantidade de publicação, e não no impacto de cada uma. Uma possível solução para isso seria as empresas começarem a realizar pesquisa. Antes fosse tão simples quanto parece, já que os brasileiros estão descrentes dessa possibilidade. Um exemplo da descrença está neste trecho de uma entrevista dada pelo professor José Palazzo Oliveira:
… não vejo disposição dos empresários brasileiros assumirem a real pesquisa. Aqui não vejo nenhuma IBM com vários prêmios Nobel (Harry Markowitz, J. Georg Bednorz e K. Alex Müller, Gerd K. Binnig e Heinrich Rohrer, Leo Esaki). Aqui temos empresários que ganharam minas de ferro do pai e ficam famosos. Há alternativa científica para substituir as Universidades? Não enquanto não tivermos empresas do porte e com a mentalidade de competidores mundiais em conhecimento…
Dessa forma, qual seria uma boa saída então? Na mesma entrevista, Palazzo dá uma dica:
… A Universidade deve incentivar seus alunos a serem inovadores. É preciso que criem conhecimento fora da Universidade e que este conhecimento possa ser reconhecido e formalizado na Universidade. Ações como o “Y Combinator” oferecendo pequenos valores para inúmeras startups é uma saída. Mas é preciso saber como reconhecer as competências adquiridas, só ter ganho dinheiro não é a métrica adequada para avaliar a inovação…
Não apenas incentivar os alunos a serem inovadores, as universidades deveriam incentivar o empreendedorismo para criar uma mola propulsora a fim de estimular o desejo de empreender. Quem sabe assim os estudantes comecem a pensar além das possibilidades de serem somente um funcionário ou de prestarem um concurso público em troca de “segurança”. Dessa forma, poderiam passar a ter um papel de destaque na transformação do país quanto à inovação.
Vejamos agora o objetivo dos centros de pesquisa, vistos atualmente como uma das poucas fontes de inovação no nosso país. Por aqui, eles costumam existir vinculados a grandes universidades, dificilmente vemos empresas brasileiras de software com centros de P&D. Contudo, em multinacionais a visão é outra: além de estimularem a pesquisa, elas enxergam no Brasil a possibilidade de construir novos centros a fim de aproveitar técnicos, engenheiros e pesquisadores criativos e flexíveis. Além disso, Tales Andreassi, professor e coordenador na FGV, afirma que o interesse no país também se dá pela capacidade dos mestres e doutores de conduzir os centros de pesquisa. A realidade é que essas empresas também recebem pacotes de incentivos para se instalarem no Brasil. Esse apoio atraiu empresas como a IBM, que, depois de 94 anos de operação por aqui, instalou o seu primeiro centro de P&D no ano passado.
Por outro lado, temos as startups. Podemos chamar de startup um modelo de empresa jovem, embrionária, recém-criada, ou ainda em fase de constituição, implementação e organização de suas operações. O termo possui uma herança de empreendedorismo e inovação bastante forte, porque foram a partir de startups que surgiram empresas como Google e Facebook, que se beneficiaram de crescimentos explosivos e hoje lideram segmentos dos mercados em que atuam.
No Brasil, existem diversas startups que já fazem sucesso (pelo menos no país ou na América Latina) como é o caso de Buscapé, Até Passar e boo-box. Para a maioria das startups, não faltam ideias e vontade de empreender novos negócios inovadores. O que costuma faltar é a verba. Uma alternativa para financiar essas empresas são os investidores anjo. Já existem alguns grupos desses investidores no país, entre eles: o Floripa Angels, o Gávea Angels e o São Paulo Anjos. Cada grupo de investidores é focado em um segmento de negócio no qual busca investir. As startups também podem contar com incentivos governamentais, fornecidos quando elas promovem inovação.
Agora, com uma breve noção do papel dos principais atores envolvidos na construção da inovação, podemos entender melhor a interação entre eles.
Interagindo com os atores da inovação
Sabemos que para a inovação acontecer é necessária a colaboração entre diversas entidades. Para facilitar a compreensão visual dessa interação, é apresentado na Figura 1 um possível ecossistema da inovação brasileira. Lembrando que essa figura foi elaborada com base em estudos sobre o assunto, sendo assim, podem estar faltando informações. Caso o leitor queira sugerir melhorias, serão bem-vindas.
Analisando a Figura 1, podemos notar que os principais elementos responsáveis por gerar a inovação são os centros de P&D e as empresas/startups. Os incentivos financeiros costumam vir de fundos (considerando aqui fundos de amparo e investidores) e do governo. O governo, de uma forma geral, busca incentivar através de isenções fiscais, por exemplo. Além disso, ele paga as contas das universidades públicas, que por sua vez deveriam estimular os alunos a inovarem e realizar parcerias com os centros de pesquisa. Com a Embrapii, o governo passará a agir também como um agente catalizador para que os centros de pesquisa e as empresas atuem em parceria em busca da inovação. Essa foi a forma que o governo encontrou de buscar estimular as empresas a serem mais atuantes nesse cenário.
Figura 1. Ecossistema da Inovação
Por fim, sabemos que não é só dinheiro que falta para termos mais inovação. Outras questões precisam melhorar, como a desburocratização dos ambientes de negócios, que acaba consumindo muito tempo dos empresários com as atividades operacionais. Por outro lado, apesar de existir um ecossistema, Frederico von Ah (Gerente Sênior da consultoria KPMG) lembra que ele precisa ser fortalecido.