Carreira Dev

16 set, 2013

O Brasil ainda está na era do “mobile also”

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A mobilidade ainda é vista por muitas empresas e CIOs como um tópico de TI separado das estratégias de TI e de negócios. Mas, é indiscutível que ela já está influenciando as próprias estratégias de negócio de muitas empresas e este fenômeno deve se alastrar nos próximos anos. O mundo está cada vez mais móvel e o atual pensamento de “mobile also”, no qual os dispositivos móveis são apenas mais um browser ou ponto de visualização de informações, como um desktop ou laptop, já se mostram inadequados para obter ou manter vantagens competitivas pelas empresas.

Smartphone e tablets já são hoje, para muitos, os primeiros locais onde se busca acessar informações. Entretanto, as áreas de TI ainda não conseguiram extrair destes dispositivos todo seu potencial.

Explorar este potencial significa criar uma estratégia Mobile First. Este conceito pode ser visto neste artigo do Gartner e na estratégia para mobilidade da IBM. Em resumo, diante da irreversível tendência dos smartphones e tablets ocuparem o espaço antes dominado pelo nosso velho conhecido, o desktop, que se torna cada vez mais irrelevante, a mobilidade – e consequentemente nossas próprias vidas digitais (pessoais e profissionais) – passarão ao largo destas máquinas. Nosso ponto de contato com sistemas e serviços digitais serão os dispositivos móveis.

Mobile First é muito mais que colocar sistemas que rodam nos desktops também nos smartphones. Permite reimaginarmos os negócios, em torno do conceito dos funcionários e clientes estarem todo o tempo conectados e engajados. É claramente uma integração coerente da mobilidade com as ondas tecnológicas do social business, cloud computing e Big data. Cria-se o conceito de omnichannel onde os diversos canais, como o físico (lojas, por exemplo), social, vídeo e sites web atuam integrados para possibilitar uma experiência única para o usuário, respondendo dinamicamente às mudanças do contexto em que o usuário está inserido a cada instante.

Este novo olhar conflita com o tradicional modelo que temos ao encarar a mobilidade, que chamamos de “Mobile also” onde os tablets e smartphones são apenas uma outra projeção dos mesmos sistemas que rodam nos desktops. Mobile First demanda um novo paradigma de pensar sistemas.

Para ficar mais claro, vamos considerar alguns aspectos do que é pensar sistemas Mobile First:

  1. É uma simplificação radical dos tradicionais sistemas monolíticos da era client-server. O app deve expor de forma intuitiva e simples sua funcionalidade, embora na retaguarda exista um complexa cadeia de tecnologias e processos interligados. Mas estes ficam invisíveis ao usuário. Hoje muitos sistemas obrigam ao usuário se envolver na cadeia de processos interligados. Um exemplo interessante deste novo conceito é o Instagram. Altamente complexo em termos de tecnologia na retaguarda, mas intuitivo e simples de usar.
  2. Cria uma extrema personalização. Baseado no conceito de Big data e na imensa pegada digital que deixamos ao longo de nossa vida o app conhece nossos hábitos, e mesmo intenções. Age de acordo com o contexto. É um modelo bem diferente de um aplicativo desktop que não se ajusta as necessidades únicas de cada usuario. O usuário é que se adapta a ele.
  3. Incentiva participação e colaboração. Explora o comportamento social, típica das plataformas sociais, como técnica de engajamento do usuário. É diferente dos aplicativos desktop, onde o usuário navega nele de forma isolada.

O projeto de apps Mobile First concentra-se na experiência de engajamento em tempo real (é o conceito de systems of engagement) e com isso demanda uma infraestrutura ágil e elástica. É a integração com cloud computing.

Implementar o conceito Mobile First vai além do repensar os aplicativos. Muda a própria doutrina operacional da área de TI.

Uma destas mudanças é considerar que nem todos os sistemas podem ser classificados de forma similar, quanto à sua adesão ao conceito de Mobile First. Continuarão a existir sistemas tradicionais ou os “system of records” como os ERP que suportam o processamento básico das transações de negócio. Não são sistemas que hoje geram vantagens competitivas mas sistemas “must have”. Quem não tem, perde. Quem os tem, está simplesmente no jogo.

Os systems of engagement estão na camada acima. São eles que fazem a diferenciação e criam inovação na relação com os usuários, sejam eles clientes ou funcionários. Seus ciclos de desenvolvimento e entrega para operação são muito mais rápidos, demandam menos requisitos funcionais e devem provocar experiências positivas e diferenciadas. Para efeito de comparação, um típico e tradicional system of records tem seus ciclos de evolução e são  medidos em um ou mais anos e entregues em novas e pesadas versões. Um ERP é um exemplo típico. A  cada dois anos chega uma nova versão que obriga as empresas a fazer uma verdadeira reimplementação. Por sua vez, os systems of engagement têm ciclos muito menores, com updates mensais, semanais ou mesmo diários. Adotam o princípio de MVP (Minimum Viable Product) proposto por Eric Ries em seu livro “Lean Startup” (que, aliás recomendo fortemente ler).

Mas, claro, eles têm que acessar informações dos sistemas que operam os processos “core” da empresa. Portanto, os próprios system of records devem ser também repensados como uma base de sistemas cujos serviços e funcionalidades sejam expostos via APIs. Estes serviços e funcionalidades passam via APIs a serem expostos como apps móveis. É também um repensar e rejuvenescimento  do SOA.

Outra mudança nas doutrinas de TI é a crescente adoção de lojas de apps internas (ao lado das store app externas) para disponibilizar os apps constituintes do portfólio de systems of engagement. Um post do Gartner diz claramente que em 2017 25% das empresas terão sua própria app store.

Em resumo, a mobilidade é uma onda gigantesca que já está quebrando sobre nós. Embute um novo paradigma de pensar aplicações. E em consequência, traz novos desafios que não podem ser resolvidos à luz dos conceitos e hábitos do paradigma anterior. Os CIOs e os profissionais de TI devem olhar com atenção e começar a colocar em prática estratégias de negócio onde a mobilidade faça parte integrante e essencial. Adotar mobilidade como ação tática e isolada é uma trilha errada que não deve ser precorrida. O custo de voltar atrás e reiniciar no caminho certo pode ser muito cara  à própria empresa.

Constato, nas palestras e conversas com CIOs, que no Brasil ainda estamos em uma fase de imaturidade quanto ao potencial da mobilidade. O conceito dominante é ainda “mobile also”, mas aqui e ali algumas empresas já descobriram a rota correta. As demais devem seguir este caminho. É ele que vai nos levar à frente na sociedade digital, dominada cada vez mais pela mobilidade. Afinal, parodiando Nicholas Negroponte, “Mobile is not about smartphones or tablets anymore. It is about living…”.