Desenvolvimento

15 fev, 2016

Mulheres escrevem códigos melhores, mas só se não revelarem que são mulheres

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Quando um grupo de estudantes de Ciência da Computação decidiu estudar a maneira como o preconceito de gênero se desenrola em comunidades de desenvolvimento de software, eles assumiram que os programadores seriam prejudicados contra códigos escritos por mulheres. Afinal, as mulheres constituem uma porcentagem muito pequena de desenvolvedores de software – de 11,2%, de acordo com uma pesquisa de 2013 – e a presença do machismo em todos os cantos da indústria de tecnologia predominantemente masculina tem sido bem documentada.

Assim, os pesquisadores foram surpreendidos quando sua hipótese se revelou falsa – o código escrito por mulheres era de fato mais provável de ser aprovado por seus pares do que o código escrito por homens. Mas isso só se provou verdadeiro, desde que seus pares não percebessem que o código tinha sido escrito por uma mulher.

“Nossos resultados sugerem que, embora as mulheres no GitHub possam ser mais competentes, o viés contra elas existe”, afirmaram os autores do estudo.

Os pesquisadores, que publicaram as suas conclusões na semana passada, analisaram o comportamento de desenvolvedores de software no GitHub, uma das maiores comunidades de software de código aberto do mundo.

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Os pesquisadores analisaram aproximadamente 3 milhões de pull requests no GitHub, e descobriram que o código escrito por mulheres foi aprovado em uma taxa mais elevada (78,6%) do que o código escrito por homens (74,6%).

Em busca de uma explicação para essa disparidade, os investigadores examinaram vários fatores diferentes, como se as mulheres estavam fazendo pequenas alterações no código (não estavam) ou se elas foram superando os homens em apenas certos tipos de códigos (não foram).

“As taxas de aceitação das mulheres são superiores às dos homens em todas as 10 principais linguagens de programação, em graus diferentes”, descobriram os pesquisadores.

Em seguida, os pesquisadores questionaram se as mulheres estavam se beneficiando de polarização reversa – o desejo de desenvolvedores de promover o trabalho das mulheres em um campo onde elas são uma pequena minoria. Para responder a isso, os autores diferenciaram as mulheres cujos perfis deixavam claro que elas eram do sexo feminino e das desenvolvedoras mulheres cujos perfis tinham gênero neutro.

Foi aqui que eles fizeram a descoberta perturbadora: o trabalho das mulheres só era mais susceptível de ser aceito que o dos homens se o seu gênero não fosse identificável; caso fosse, a taxa de aceitação era pior do que a dos homens.

Entrevistas com desenvolvedores do sexo feminino que usam GitHub revelaram um quadro complicado de navegar pelo preconceito em relação a gênero no mundo do código-fonte aberto.

Lorna Jane Mitchell, uma desenvolvedora de software cujo trabalho é quase totalmente baseado no GitHub, disse que era impossível dizer se um pull request havia sido ignorado por preconceito ou apenas porque um proprietário do projeto estava ocupado ou conhecia outro desenvolvedor pessoalmente. O perfil dela no GitHub claramente a identifica como mulher, algo que ela não vai mudar com base nos resultados desse estudo. “Ponderei os pontos positivos e negativos em ter um perfil com gênero definido e, para mim, ser identificada como do sexo feminino é realmente importante”, disse Mitchell por e-mail. “Quero que as pessoas percebam que as minorias existem. E para as próprias minorias: sejam capazes de ver que elas não são as únicas… “.

Outra desenvolvedora, Isabel Drost-Fromm, cuja imagem de perfil no GitHub é um personagem feminino de desenho animado, disse que ela nunca vivenciou preconceito enquanto trabalhava com o GitHub, mas que ela normalmente usa o site para trabalhar em projetos com uma equipe que já conhece a ela e a seu trabalho.

Jenny Bryan, uma professora de estatística da Universidade British Columbia, usa o GitHub como professora e desenvolvedora em R, uma linguagem de programação. Seu perfil deixa claro que ela é uma mulher, e ela não acredita que tem sido discriminada devido ao seu sexo. “Quando muito, os homens que não me conhecem por vezes me explicam coisas que eu provavelmente entendo melhor do que eles fazem”, ela escreveu. “Os homens com quem eu interajo na comunidade de R no GitHub me conhecem, e eu sinto que eles apoiam os meus esforços para aprender e fazer mais contribuições”.

Bryan estava mais preocupada com a escassez de mulheres que usam GitHub do que com os resultados do estudo. “Onde estão as mulheres?”, ela perguntou. Uma possibilidade que ela levantou é a própria abertura da comunidade de código aberto. “No código aberto, ninguém está sendo pago para gerenciar a comunidade”, escreveu. “Assim, muitas vezes, ninguém está pensando sobre o quão bem (ou não) é o funcionamento da comunidade”.

Essa é uma questão premente para o GitHub, que tem enfrentado sérias acusações de machismo interno que levaram à demissão do cofundador e CEO Tom Preston-Werner em 2014. O GitHub não respondeu imediatamente a um pedido de comentário sobre o estudo.

Com informações de The Guardian