Marketing Digital

10 fev, 2014

A editora do futuro será uma startup de conhecimento, informação e entretenimento

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Uma resenha de “Livro Digital etc.”, de Fábio Flatschart (Editora Brasport, 2014).

[001] UMA DAS “AGENDAS” MAIS IMPORTANTES daqueles que participam do “ecossistema” do mercado editorial digital no Brasil é a participação ativa na disseminação de uma cultura digital honesta, generosa e responsável.

[002] Dito isto, a tarefa (importante) a que se propõe Fábio Flatschart, autor do Livro Digital etc. (Brasport, 2014), não pode ser considerada trivial: apresentar um texto de fácil compreensão, atualizado, sobre aspectos fundamentais do universo do livro digital, voltado tanto para os neófitos quanto para os que já batalham nas “trincheiras” do livro digital no Brasil.

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[003] Fábio (que é colaborador do portal iMasters, onde também sou articulista) desempenha bem sua tarefa, e não o faz sem uma boa estratégia. Sabemos que este Livro Digital etc. não é o primeiro sobre este tema no Brasil, mas (sem nenhum menosprezo por seus antecessores) penso que seja o livro certo no momento certo. O autor, logo nas primeiras páginas, nos mostra o seu plano de projeto: não se trata de um trabalho “acadêmico”, mas de um retrato do que foi experimentado por ele nos anos de prática profissional e como professor.

[004] Li o livro com prazer. Sua leitura não me ocupou mais do que uma hora. O que se deve não só ao interessante tema, mas também à boa exposição do autor e histórias que compartilha com seus leitores.

[005] A ideia da obra, confessa Fábio, surgiu da constatação recorrente de que, quando se trata do livro digital, o que mais há, é incerteza, seja no que diz respeito aos modelos de negócio emergentes, à relação autor + editora + leitor, aos livros “interativos”, ao self-publishing, etc e etc.

O e-reader do futuro (revista Everyday Science and Mechanics, edição de abril/1935)
O e-reader do futuro (revista Everyday Science and Mechanics, edição de abril/1935)

[006] Por isso, um dos desafios a que o autor se propõe é o de relacionar conceitos e interligar ideias (mais do que enumerar e descrever ferramentas).

[007] O livro é dividido em 6 partes:

[008] Rumo ao digital, além de conceituar livros e e-books, traz uma abordagem histórica do livro digital, desde os primeiros projetos, experimentos e protótipos. Cita uma certa revista da década de 1930 que tentou prever como se leria um livro no futuro (o nosso presente), lembra de Vannevar Bush, que imaginou o Memex (memory + index, foi uma máquina que auxiliaria a memória e armazenaria conhecimento), e do Hypertext Editing System (HES), projeto de pesquisa em hipertexto, realizado na Universidade de Brown, em 1967, por Andries van Dam, Ted Nelson, e vários alunos daquela universidade. O HES rodava em um computador de grande porte IBM System/360. Fábio também não esquece do abnegado Michael Stern Hart, falecido em 2011, considerado inventor do livro digital efundador do Projeto Gutenberg, marco inicial da história dos e-books.

Hypertext Editing System (HES), IBM 2250 Display com lightpen (Brown University 1969).
Hypertext Editing System (HES), IBM 2250 Display com lightpen (Brown University 1969).

[009] O segundo capítulo, Formatos, trata dos diferentes tipos do livro digital. O autor defende apaixonadamente o HTML como

[010] centro nevrálgico do livro digital em seus vários formatos e do ePUB como a grande plataforma aberta de publicação.

[011] Ao falar dos formatos de arquivos flexíveis e práticos (TXT, RTF, ODT, entre outros), o autor faz uma associação do livro digital com as liberdades de uso, estudo, distribuição e modificação do software livre (e aqui não podemos deixar de lembrar de Richard Stallman, criador do GNU Project e da Free Software Foundation, que ajudou a estabelecer esses conceitos). Uma atenção especial é dada aos formatos PDF, HTML 5, EPUB (2 e 3) e também aos aplicativos.

Richard Stallman na University of Pittsburgh (2010)
Richard Stallman na University of Pittsburgh (2010).

[012] No terceiro capítulo, Dispositivos de Leitura, o autor apenas tece rápidos comentários sobre os dispositivos eletrônicos de leitura, compreendendo que se trata de um assunto que rapidamente se tornaria obsoleto com a profusão de lançamentos que temos de novos e novos aparelhos no mercado.

[013] Em Processos, quarto capítulo, são abordados prováveis fluxos de trabalho na produção editorial digital e a importância de termos o conteúdo, acessível por todos, em qualquer dispositivo, em qualquer lugar.

[014] Ainda que seja um “sonho” um pouco longe de ser concretizado, concordo com o autor quando ele enfatiza a importância de se buscar a otimização de um fluxo de trabalho, com a concepção aberta e modular de toda a cadeia produtiva. E mais, que não deveríamos, como editores, apostar em processos específicos e fechados baseados em uma única plataforma ou serviço proprietários (o grifo é meu).

[015] Creio que cada vez mais buscaremos implementar, no editorial, o conceito de single sourcing, baseado em metodologias e ferramentas livres, de código aberto. O single sourcing, para quem não conhece, é um método de reutilização sistemática da informação, muito usado na produção de documentação de software.

[016] Através desse método desenvolvemos conteúdos modulares em um único documento ou banco de dados, e depois, “compilamos” esse(s) conteúdo(s) em diferentes formatos de documentos para diferentes audiências e propósitos.

[017] Modelos de negócios, o quinto capítulo, é, na verdade, uma coletânea de artigos de colaboradores convidados pelo autor para dar os pontos de vistas do empreendedor para os novos paradigmas de negócios do mercado editorial centrados no tema livro digital. Uma importante reflexão sobre o DRM (Digital Rights Management ou Gestão de Direitos Digitais) é apresentada nesse capítulo. Eu, particularmente, acho que o DRM prejudica a indústria, nos dificulta o avanço e a inovação, além de não resolver 100% dos problemas que muitos acham que ele resolve, como por exemplo, evitar as cópias não autorizadas.

[018] A ultima parte do livro, intitulada O livro na Open Web, trata da cada vez mais inevitável integração do livro com a web. O autor se mostra inspirado ao apresentar sua concepção (talvez, utópica) de que

[019] a editora do futuro será uma startup de conhecimento, informação e entretenimento, produzindo conteúdo multimídia de maneira autoral ou colaborativa.

[020] Em 2009, eu escrevi um artigo em que sugeria que tanto o jornal quanto o livro deveriam ser vistos como software. Desde então, confesso, que mudei um pouco de opinião. Hoje, eu acho que a editora é que deve ser pensada como software.

[021] A editora do futuro será um aplicativo, ou vários, já que poderá atuar em outras áreas e mercados que hoje podem ainda ser impensáveis para a maioria dos editores brasileiros.

[022] Parabenizo a editora e o autor pelo lançamento de Livro Digital etc. Compartilho de muitas das opiniões expostas nesse livro. Como e-publisher, eu acredito, piamente, que o “centro das atenções” deve estar no leitor, ele é o verdadeiro protagonista. E como tal, o “futuro” do livro digital (do mercado editorial digital como um todo) a ele pertence.

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FLATSCHART, Fábio. Livro Digital etc. Versões impressa e digital. Rio de Janeiro: Editora Brasport, 2014 [Prefácio: Gabriela Dias].