Em quase duas décadas atuando com tecnologia — entre servidores barulhentos em salas improvisadas e sistemas críticos que simplesmente não podiam falhar — aprendi uma lição que se tornou meu norte profissional: a tecnologia só é útil se for segura, compreensível e sob controle. E hoje, em um cenário onde a inteligência artificial invade tudo — dos e-mails aos contratos, dos relatórios financeiros ao comportamento de consumo — vejo um novo tipo de urgência bater à porta das pequenas e médias empresas (PMEs): como crescer tecnologicamente sem expor seus dados, sua equipe e, principalmente, seus clientes?
Essa pergunta não tem uma resposta única. Mas tem caminhos possíveis. E alguns deles, eu já percorri — ora como gestor de TI no setor público e industrial no Brasil, ora como fundador de uma empresa de tecnologia nos Estados Unidos, dedicada justamente a oferecer soluções escaláveis e seguras para quem, muitas vezes, é deixado de lado pelas grandes plataformas.
O paradoxo do crescimento digital
Lembro bem de um cliente no interior de Minas Gerais, há mais de dez anos, que me dizia com orgulho: “Aqui está tudo na planilha, e com senha!”. Na época, a tecnologia era quase um luxo para empresas fora dos grandes centros. Hoje, esse mesmo perfil de negócio usa Google Workspace, sistemas de gestão em nuvem, WhatsApp API, VoIP e até controle remoto de câmeras e estoques. A transformação foi vertiginosa. Mas a proteção não acompanhou o mesmo ritmo.
É aí que mora o problema
A mesma infraestrutura que permite agilidade, colaboração e escala, também abre portas para ataques digitais, se não for bem desenhada. E os dados comprovam isso: ataques cibernéticos contra PMEs cresceram mais de 600% nos últimos anos. Eu mesmo já atendi empresas que perderam anos de contratos e históricos de clientes por não terem backup estruturado — ou por confiarem demais no “isso nunca vai acontecer com a gente”.
Cinco pilares para inovar com segurança
Com base em tudo que vivi, montei uma estrutura de cinco pilares que costumo aplicar com meus clientes. Eles não são uma receita pronta, mas um guia realista, especialmente para quem não tem uma equipe de TI dedicada, mas precisa operar com o mesmo nível de responsabilidade de uma grande corporação.
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Conheça sua maturidade digital (antes de investir mais)
Parece óbvio, mas muitos empresários saem comprando licenças, softwares e ferramentas sem saber como está sua rede local, quem tem acesso aos dados, se o Wi-Fi da empresa tem senha forte ou se o antivírus foi renovado. Já ajudei empresas que usavam soluções de ponta, mas deixavam o servidor exposto com senha “admin123”. Primeiro passo: diagnóstico técnico e comportamental.
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Use infraestrutura escalável, mas controlada
Soluções como Google Workspace ou Zoho são excelentes para colaboração. Mas precisam ser configuradas com lógica de permissão, autenticação em dois fatores e controle de acesso. Escalar, sim. Desordenar, nunca. Já presenciei equipes inteiras com acesso irrestrito a documentos financeiros, apenas por “facilidade”.
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Traga a segurança para o centro da operação
Aqui entra o que mais defendo: firewalls bem configurados, segregação de rede, backups automatizados, VoIP com criptografia e acesso físico protegido aos equipamentos. Já ajudei uma empresa de comércio eletrônico a se recuperar de um ataque que bloqueou o estoque inteiro — a chave estava no fato de o banco de dados estar num servidor sem senha de root.
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Treine sua equipe — sempre
Segurança digital não é apenas técnica. É cultura organizacional. Já perdi a conta de quantas vezes vi colaboradores clicando em links de phishing, baixando “atualizações” de remetentes falsos ou compartilhando senhas no grupo do WhatsApp. Segurança é um processo educacional contínuo, e o custo de um incidente é infinitamente maior do que o de um bom treinamento anual.
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A IA deve ser aliada — mas sob vigilância
Sim, eu uso inteligência artificial no meu dia a dia. Automatizo tarefas, faço análises preditivas, melhoro luxos. Mas sempre com governança. A IA pode ajudar a proteger (com monitoramento de tráfego, reconhecimento de padrões anômalos, etc.), mas também pode ser usada para atacar. Deepfakes, bots que invadem CRMs, scripts que simulam clientes. Usar IA sem critérios éticos e técnicos é brincar com fogo.
Conclusão:
A segurança como parte do crescimento, não como obstáculo
Depois de tantos anos vivenciando a TI no chão da fábrica, nos bastidores de empresas públicas, na rotina de pequenas empresas e agora liderando uma empresa de tecnologia aqui nos EUA, posso airmar com convicção: proteger dados não atrasa o crescimento. Pelo contrário, acelera com confiança.
Já vi empresas perderem tudo por não terem um backup fora do servidor físico. Já vi outras florescerem após implantarem um ERP seguro e parametrizado. Em todos os casos, o que fez a diferença não foi o tamanho da empresa, mas a mentalidade do líder.
Se você é gestor de uma PME e sente que precisa evoluir, mas teme os riscos… saiba que o maior risco é não agir. Investir em segurança hoje é mais barato — e muito menos doloroso — do que explicar amanhã para um cliente que seus dados foram vazados.
Transformação digital sem blindagem é avanço com prazo de validade. Já com estratégia, treinamento e ferramentas certas, ela vira um motor de crescimento — contínuo, ético e sustentável.
E no final das contas, como sempre digo: não basta estar online. É preciso estar preparado.