Desenvolvimento

14 abr, 2014

Garoa Hacker Clube: um lugar para trocar, aprender e compartilhar

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Você se lembra do Mundo de Beakman, aquele programa infantil de televisão no qual um pessoal maluco lia cartas de telespectadores e executava experiências fáceis de fazer em casa? Esse programa mudou minha infância; foi por causa do Beakman que eu derreti muitas canetas, brinquei com pilhas e construí uma casinha na árvore, feita de madeira encontrada na rua, para fundar um pequeno clube onde eu pudesse reproduzir as coisas que eu via no programa, ou lia nos livros de eletrônica do meu pai, junto com meus amigos. Só que ninguém tinha coragem de entrar para o meu “clubinho”, cuja sede era um tanto quanto perigosa se tivesse mais de duas pessoas dentro dela. Então, eu brincava ali sozinha.

O tempo passou, a casinha da árvore caiu, eu virei adulta, comecei a trabalhar com Tecnologia da Informação, passei pela faculdade de Física sem concluí-la e comecei vários projetos independentes. Nunca deixei de sonhar com a existência do meu “clubinho”, onde eu pudesse estudar eletrônica, robótica, arte e biologia, com pessoas que gostassem tanto daquilo quanto eu. De forma livre. Um lugar aberto à participação de qualquer um, diferente dos laboratórios de faculdade (cheios de restrições e horários), longe de interesses comerciais de empresas, e sem ser do domínio de nenhum governo. O posterior envolvimento com o mundo do software livre só fez crescer essa ideia, mas eu nunca pensei que isso tivesse algum potencial para existir de verdade.

Até que em 2011, em um dia qualquer, enquanto procurava apartamentos para dividir, olhei um mural de anúncios. Havia um papel amarelo fixado bem no meio, com uma pergunta estranha: “o que é um hackerspace?”. Nesse segundo, eu jamais adivinharia, nem nos meus sonhos mais ousados, que eu ficaria os próximos dois anos da minha vida respondendo exatamente a essa mesma pergunta, para várias pessoas, em vários momentos.

E foi assim que eu li sobre o Garoa Hacker Clube pela primeira vez. Naquela época, maio de 2011, o Garoa se firmava como o primeiro hackerspace do Brasil e comemorava quase um ano em seu primeiro local de encontro físico: o porão da Casa da Cultura Digital. Ele havia nascido de uma lista de discussão no Ning e eu só tomaria coragem para ir até lá em outubro daquele ano porque – coincidência do destino? – eu aceitara como roommate uma garota vinda de Brasília, a Carine Roos, que foi a primeira mulher a se tornar sócia do clube.

O Garoa Hacker Clube é, legalmente falando, uma associação – em termos chatos, uma pessoa jurídica de direito privado, sem fins econômicos ou lucrativos.” Hoje o Garoa vive de doações e mensalidades pagas pelos seus sócios. Mas para participar você não precisa ser sócio: basta querer. É só dar uma olhada na grade de programação e chegar lá, é de graça.

O Garoa é muitas coisas, e nunca é o que a gente imagina antes de chegar lá. É uma casa, uma comunidade, um lugar para fazer um churrasco, um clube para jogar jogos de tabuleiro, uma oficina para aprender a consertar coisas, uma escola de programação e eletrônica, um centro de eventos, um grupo de amigos, um lugar para ver uma impressora 3D funcionando (de graça!), uma casa com uma horta, uma associação com hierarquia documentada e raramente exercida… ufa. O Garoa é, em outras palavras, o meu “clubinho”.

Lá eu já fiz curso de desenho, aprendi Arduino, aprendi a abrir fechaduras sem chaves, bebi muitas cervejas, discuti qual é a origem do universo, já dei aula de WordPress para pessoas que nunca viram uma linha de PHP ou HTML na vida, comi muitas pizzas, dei muita risada, e principalmente: fiz grandes amigos. Inclusive, foi lá que eu aprendi como furar parede, na época do porão ainda, e foi nessa noite que a gente estourou – e reparou – um cano. De ferro. Com um maçarico, que alguém foi buscar lá em Osasco, às 10h da noite.

“Temos um espaço permanente e em constante evolução em umacasa em Pinheiros, aberto a todos que o quiserem frequentar, gratuitamente. Temos diversos equipamentos, ferramentas e materiais para a realização de projetos […]”

Hoje não somos mais só um porão de 12m² e poucos ‘gatos pingados’, ou só uma lista de discussão de e-mails (embora seja importante você participar da lista de e-mails, se quiser frequentar). Somos uma família de curiosos, com uma casa grande, perto do metrô, de portas abertas, esperando qualquer pessoa que queira se juntar a nós. Seja programador, desenhista, escritor, advogado, costureiro, engenheiro, homem, mulher, heterossexual, homossexual, transexual, vegano, carnívoro, fã de Mac, usuário de Linux, alto, baixo, gordo, ou magro. Tanto faz.

O Garoa Hacker Clube é um espaço para qualquer pessoa levar sua criatividade, ideologia e novos projetos que façam bem à comunidade e possam ser compartilhados, desenvolvidos e apropriados por outras pessoas. Sejam projetos relacionados a tecnologia, ciência ou arte: tudo é bem-vindo. Se casar todas essas áreas, melhor ainda.

Nos últimos anos, vimos hackerspaces abrindo em outras cidades pelo Brasil afora. Em Porto Alegre, em Florianópolis, no Rio de Janeiro e em várias outras. O movimento dos hackerspaces existe no mundo inteiro, e você sempre será bem-vindo a visitar e desfrutar de qualquer um deles, em qualquer lugar do planeta. O clubinho aceita todo mundo que tenha vontade de pôr a mão na massa, contribuir e se divertir. Se você não sabe, a gente te ensina. E se a gente não sabe, aprendemos todos juntos.

PARTICIPE!

  • IRC – #garoa em irc.freenode.net
  • Lista de discussão – hackerspacesp@googlegroups.com
  • Twitter – @garoahc
  • Identi.ca -!garoa
  • Wiki – https://garoa.net.br/wiki/

 

Lista de hackerspaces no Brasil: https://garoa.net.br/wiki/Hackerspaces_Brasileiros

Aprenda como criar um hackerspace: https://garoa.net.br/wiki/Como_criar_um_hackerspace

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Artigo publicado originalmente na Revista iMasters de fevereiro.