DevSecOps

20 out, 2014

Hiperconexão, aqui vamos nós

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Com a colaboração de Yasodara Córdova

O que há 20 anos era ficção, hoje é realidade graças a uma combinação de quatro elementos: criatividade, mobilidade, velocidade e massificação de dispositivos móveis interconectados pela Internet. Desde o artigo seminal de Mark Weiser, em 1991, sobre o computador do século 21 (que já previa uma rede de dispositivos inteligentes), passando por 1999, quando foi cunhado o termo Internet das Coisas, por Kevin Ashton, a conexão de recursos na Internet deu grandes saltos. A tendência é que até 2020 este mercado gire em torno de US$2 trilhões e entre 26 a 50 bilhões de dispositivos, segundo diversas consultorias, como a Pew Research, Gartner e ABI Research.

Estamos no momento de debater os desafios em áreas como interação, privacidade, mercado e infraestrutura, para citar as principais. Mas antes de abordar cada uma delas, é importante analisar o conceito por trás da Internet e da Web das Coisas. Talvez justamente por ser um dos assuntos do momento, o tema tem inspirado toda sorte de interpretações, inclusive as que pouco tem a ver com o seu real significado.

A Internet das Coisas (em inglês, Internet of Things – IoT) é a conexão entre recursos, sejam eles um objeto, serviço, entidade, ser humano, animal ou qualquer outro tipo de dispositivo capaz de estar conectado à Internet. Pressupõe-se que as ‘coisas’ estejam conectadas a Internet, pois elas não são capazes de se comunicar entre si e com as pessoas. A Web das Coisas, por sua vez, traz como benefício o uso da Web como uma plataforma de integração de dados e objetos de tal maneira que usuários possam ter acesso e reutilizar dados e objetos em aplicações web.

Para os profissionais que trabalham com tecnologia, a Internet das Coisas é um extenso campo a ser explorado, pois a interação com os dispositivos conectados precisa ser invisível. Quando Tim Berners-Lee criou a Web, ele conseguiu prover acesso ao conteúdo disponível na Internet porque inventou o conjunto de padrões da plataforma web. É fundamental, especialmente nessa fase inicial de experimentação, um esforço de boas práticas para que os dispositivos sejam relativamente fáceis de interagir, tanto quanto a Web.

O W3C tem trabalhado para promover o uso da Web como a plataforma ideal para garantir a interconexão, interoperabilidade e interação entre dispositivos e pessoas. Já existe um grupo dedicado ao tema, estudando formas de interação da Web com televisores, câmeras, sensores semânticos, entre outros dispositivos, e estão em processo de desenvolvimento, por exemplo, APIs de interação com TVs via controle remoto e APIs de interação com interfaces hápticas, ou seja, sensíveis ao toque.

Outro tópico que não pode ficar de fora quando se fala em Internet das Coisas é a privacidade. Particularmente porque nesse ambiente conecta-se hardware de baixa tecnologia e com grande vulnerabilidade. Medidores de energia inteligentes já podem revelar o perfil diário de comportamento de uma família pela grade de consumo de energia durante o dia, até mesmo se há pessoas em casa ou não.

O tópico está no radar do W3C, que vem desenvolvendo APIs de criptografia para Web. Ainda que aparentemente não haja soluções técnicas para esse tópico, pelo menos alguns mecanismos deveriam constar em políticas de proteção de dados pessoais.

Em casos de hardwares inteligentes, capazes de monitorar o corpo humano e manter cadastros de dados online, como garantir que essas informações não caiam nas mãos da sua empresa de seguros, do seu banco ou mesmo de um futuro chefe em potencial? Alguns países já possuem leis de proteção de dados pessoais, mas o Brasil ainda está engatinhando nesse aspecto, apesar de ter dado um passo importante com a aprovação da lei do Marco Civil da Internet. Por enquanto, existe um anteprojeto de lei de proteção dos dados pessoais em tramitação que prevê, entre outros aspectos, o modo de tratamento das informações dos brasileiros por entidades públicas ou privadas.

As soluções de Internet das Coisas já existem em diferentes mercados, especialmente nos segmentos de automação residencial e manufaturas. O grande desafio é a Web das Coisas, ou seja, construir aplicações e serviços que rodam no topo da Internet das Coisas. Por outro lado, a falta de mão de obra especializada vai desde o desenvolvedor que escreve o protocolo, ao engenheiro que constrói o sensor, passando pelo fornecedor de material para o objeto. As oportunidades de mercado não ficam restritas apenas às grandes empresas. Em termos de mercado de trabalho, a mão de obra necessária para criar softwares capazes de traduzir para as máquinas bits coletados de seres humanos e vice-versa é indispensável.

Temos ainda muitas limitações no que diz respeito à infraestrutura necessária para impulsionar a Internet das Coisas. É preciso investimento em redes seguras, mais empresas que forneçam serviços de satélite, maior cobertura de banda larga, a migração do IPv4 para o IPv6, além da padronização dos protocolos. Esse último ponto está diretamente relacionado à missão do W3C. É fundamental considerar a existência dos padrões e que estes sejam abertos e livres de royalties, que permitam que os dispositivos conversem entre si.

Apesar das dificuldades e do exaustivo (porém prazeroso) percurso adiante – que vai demandar forças-tarefas de tecnologia e negócios -, a Internet e Web das Coisas possuem um potencial incrível para beneficiar a saúde, o conforto, a produtividade e a segurança das pessoas e organizações. Cidades inteligentes já são reais, que o diga Barcelona, onde o uso de sensores em lixeiras públicas e áreas estratégicas para segurança incrementa a qualidade de vida de seus habitantes.

Muita coisa tem sido feita, mas ainda há muito a fazer. Paradigmas do transporte de dados, infraestrutura disponível, matéria prima e mão de obra para produção de hardware, lixo eletrônico, privacidade e segurança, entre outros, mudam completamente de figura a partir da adoção em massa de tecnologias que conectem objetos com seres humanos.

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Yasodara Córdova é strategic designer, atualmente trabalha como Developer Relations no W3C Brasil. É formada em Design pela UnB e Pós-graduada em Gestão Estratégica pela FGV. Prestou consultoria em diversos projetos de inovação, principalmente no governo, com foco em melhoria de processos para o relacionamento com o cidadão e e prestação de serviços online. Em uma outra vida, já trabalhou com jornalismo e visualização de dados, fazendo parte das equipes que ganharam o prêmio Vladimir Herzog nos anos 2008 e 2009 na categoria internet. Também é entusiasta do software livre e de projetos abertos. Evangelista de padrões web abertos, com foco em melhorar a compatibilidade de qualquer coisa em padrões modernos navegadores baseados. Promover a utilização de plataformas e técnicas de dispositivo em tudo com os padrões W3C.